Em virtude do pedido de renúncia do
cargo de ouvidor-geral do Ministério Público do Estado do Pará (MP/PA), o
Plenário do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) decidiu, por
unanimidade, pela perda do objeto quanto ao referendo do afastamento do
procurador de Justiça Ricardo Albuquerque da Silva. A decisão ocorreu nesta
terça-feira, 10 de março, durante a 3ª Sessão Ordinária de 2020.
Na mesma sessão, foi iniciado o
julgamento do referendo do procedimento administrativo disciplinar (PAD)
instaurado para apurar a conduta do referido membro. Na ocasião, o conselheiro
Marcelo Weitzel pediu vista.
O afastamento e a instauração do PAD
haviam sido determinados, nos autos da Reclamação Disciplinar 1.00901/2019-28,
pelo corregedor nacional do Ministério Público, Rinaldo Reis, mas precisavam
ser referendados pelo Plenário do CNMP.
A referida reclamação disciplinar foi
apresentada ao CNMP pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)/Seção Pará, em
função de afirmações proclamadas publicamente, por Ricardo Albuquerque da
Silva, durante palestra proferida para universitários de Direito.
À época, Albuquerque ocupava o cargo de
ouvidor-geral do MP/PA. Em um trecho gravado da fala, Albuquerque diz: “(...)
Mas é o seguinte: eu não acho que nós tenhamos dívida nenhuma com quilombolas.
Nenhum de nós aqui tem navio negreiro. Nenhum de nós aqui, se você for ver sua
família há 200 anos atrás (sic), tenho certeza que nenhum de nós trouxe um
navio cheio de pessoas da África para ser escravizadas aqui. E não esqueçam,
vocês devem ter estudado História, que esse problema da escravidão aqui no
Brasil foi porque o índio não gosta de trabalhar, até hoje. O índio preferia
morrer do que cavar mina, do que plantar pros portugueses. O índio preferia
morrer. Foi por causa disso que eles foram buscar pessoas nas tribos na África,
para vir substituir a mão de obra do índio. Isso tem que ficar claro, ora
(...)”.
De acordo com a decisão da Corregedoria
Nacional do MP, a conduta imprópria do ouvidor faz romper o natural elo de
confiança e autorreconhecimento que deve haver entre a população e o Ministério
Público brasileiro. A decisão destaca, ainda: “mostra-se incompatível o exercício
do cargo de Ouvidor-Geral no âmbito de Ministério Público Estadual por Membro
que responde a expediente disciplinar em razão da imputação de conduta
preconceituosa e discriminatória a grupos e povos tradicionais, manifestada em
palestra dotada de expressões reveladoras de menoscabo a elementos raciais,
históricos e culturais das coletividades afetadas”.
Além disso, conforme a Corregedoria
Nacional, "as Ouvidorias do Ministério Público representam um canal direto
e desburocratizado dos cidadãos, servidores e membros com a instituição, com o
objetivo de dar efetividade, manter e aprimorar um padrão de excelência nos
serviços e atividades públicos. O cargo de Ouvidor no Ministério Público é
função que exige altivez profissional e conduta funcional impecável,
notadamente por ser uma das principais portas e canal de comunicação entre a
população hipervulnerável e a Instituição ministerial. O desrespeito ao
universo identitário de determinados segmentos da sociedade torna inconciliável
a permanência do reclamado frente à direção da Ouvidoria-Geral, desestimulando
inclusive o acesso a tal órgão pelos grupos e povos atingidos pela sua
manifestação reputada como inadequada”.
A Corregedoria Nacional do MP afirma que
“a manutenção do reclamado no cargo de ouvidor impõe a permanência de um
indesejável hiato causador de crise de legitimidade institucional e de
malferimento aos princípios constitucionais da eficiência, moralidade e
cordialidade no atuar administrativo”.