O estado com a maior diversidade
e variedade de cacau no mundo voltou a ser o maior produtor de amêndoas do país
em 2016 e com perspectiva de expandir ainda mais. O crescimento do Pará no
setor iniciou há 10 anos, com a criação do Fundo de Apoio à Cacauicultura do
Estado do Pará (Funcacau), que tem possibilitado o desenvolvimento de ações
fundamentais para a expansão, modernização e consolidação da cacauicultura no estado.
Investimentos na produção e distribuição de sementes híbridas de cacau estão
entre as ações que visam à expansão da área cultivada, assim como a capacitação
de técnicos e produtores em tecnologias sustentáveis de produção.
O Estado também dá apoio na
organização dos produtores, principalmente por meio do cooperativismo,
contemplando a produção, comercialização e agregação de valor ao produto,
mediante incentivo a pequenas e médias unidades industriais.
Além de buscar quantidade, o Pará
vem procurando também qualidade, tanto que diversos investimentos vêm tendo
como ênfase a melhoria das amêndoas e a verticalização da produção,
especialmente de chocolates Premium, possibilitando aumento da renda do
produtor em até três vezes.
A busca pelo topo da produção
brasileira tomou corpo em 2014, quando foram produzidas no estado 88 mil
toneladas de sementes de cacau. Um ano depois a produção passou para 105 mil.
Em 2016, o estado atingiu 118 mil toneladas, conquistando o posto de primeiro
produtor do Brasil. Para este ano, a previsão é de aumento de 6% na produção,
ou seja, 125 mil toneladas até dezembro deste ano, mantendo o primeiro lugar.
De acordo com Afif Jawabri,
secretário adjunto de Desenvolvimento Agropecuário e da Pesca (Sedap), o
cenário é “fantástico” e o Governo do Pará tem feito um esforço muito grande
para atingir esses números. “O Funcacau
ajudou a desenvolver a cultura cacaueira no estado trazendo incentivos fiscais
e capacitação para os produtores, que vendo o resultado positivo aparecer, começaram
a se empenhar nos treinamentos e cursos oferecidos, com isso os avanços
chegaram não só para o Estado, mas também para todos os produtores que vivem da
cultura do cacau”, explicou Afif.
Ainda de acordo com o secretário
adjunto, hoje o Pará tem 875 mil hectares plantados e ainda faltam 32 mil
entrarem em produção. “Agora chegamos a outro momento, trabalhar também na
qualidade das sementes e, consequentemente, na qualidade das amêndoas
produzidas. O quilo da amêndoa comum hoje é comercializado a R$ 6,50, mas esse
preço pode aumentar muito de acordo com sua qualidade. Temos produtores no Pará
comercializando o quilo a R$ 18 e alguns até a R$ 30, por isso vamos ampliar
também os trabalhos que buscam a qualidade, para atender os mercados mais
exigentes do mundo”, complementou Afif.
Os investimentos na cultura não
foram feitos somente por que o Pará tem as melhores condições para o plantio do
cacau, mas por ele ser viável tanto do ponto de vista social quanto ambiental.
“É um fruto nativo da região amazônica e que por essa característica cresce em
pequenas propriedades, por isso é trabalhado prioritariamente por mão de obra
familiar, sendo uma excelente opção de emprego e renda para a população do
Pará”, destacou o secretário adjunto da Sedap.
Investimentos
Só para 2017, um total de R$ 2,8
milhões do Funcacau foram liberados para execução de projetos voltados ao
incremento da cultura no Pará. Os seis projetos que serão executados a partir
deste ano vão permitir a capacitação de técnicos e produtores, especialmente
nas áreas de defesa sanitária e gestão de negócios, em parceria com o Serviço
Nacional de Aprendizagem Rural (Senar).
Uma das ações prioritárias é a
produção de propágulos, materiais de ampliação da cultura, como sementes e
clones resistentes às doenças, cujo projeto executado há 10 anos pela Comissão
Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac) está em fase de teste em
Marituba, Tomé-Açu e Medicilândia.
O investimento na infraestrutura
laboratorial é também prioridade com a ampliação da biofábrica da Ceplac, em
Medicilândia, para produção de clones e instalação em outras regiões
produtoras, para aumentar a produção de cacau com qualidade. O Governo do
Estado também aprovou a instalação do Laboratório de Análise Sensorial para
exame das amêndoas, que será implantado no Parque de Ciência e Tecnologia do
Guamá, que será o segundo desse tipo no país.
Trabalhando no pós-colheita está
a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado do Pará (Emater),
que este ano conseguiu aprovar, por meio do Funcacau, um projeto de prestação
de assistência técnica aos produtores. Ao todo serão atendidos 2,6 mil pessoas
em 26 municípios do Pará ao longo de quatro anos. Investimento que chega
próximo aos R$ 5 milhões.
Paulo Lobato, engenheiro agrônomo
da Emater, explica que, durante o primeiro ano do projeto, que deve iniciar em
janeiro de 2018, serão atendidos produtores de nove municípios. A cada ano,
novos municípios serão incluídos no projeto, até que todo o estado tenha acesso
a acompanhamento técnico e capacitação.
“O produtor capacitado no
primeiro ano continua seu treinamento durante todo o tempo do projeto. Eles
aprenderão sobre manejo pós-colheita, controle sanitário, adubação e reposição,
cuidados fundamentais para garantir boa produtividade no ano seguinte, além do
beneficiamento da produção, com a secagem e fermentação, que garantem boa
qualidade da amêndoa e do chocolate posteriormente produzido”, finalizou.
Tecnologia
Trabalhando desde o campo ao
produto final, o Centro de Valorização de Compostos Bioativos da Amazônia
(CVACBA) do Parque de Ciência e Tecnologia do Guamá vem analisando as amêndoas
produzidas nas mais diversas regiões do Pará e trabalhando em sua melhoria.
“Nossas pesquisas iniciam no
campo e seguem até o produto final, que é o chocolate. Analisamos todos os
processos de produção, desde a colheita no campo, fermentação, secagem e
torração das amêndoas. Por fim, enviamos amostras para um laboratório na
Bélgica, onde são analisados o processamento e as características
organolépticas (sabor e cheiro) das amêndoas para a posterior melhoria do
chocolate”, detalhou Christelle Anne Herman, doutora em química e professora da
Universidade Federal do Pará (UFPA).
Os trabalhos do Centro de
Pesquisa são realizados em Tomé-Açu, Placas e Medicilândia, os três maiores
polos produtores de cacau do estado. Lá, todos os anos, são realizadas coletas
em várias fazendas e analisadas as amêndoas produzidas. “A maior dificuldade
que temos é a não homogeneização dos processos, por isso a qualidade das
amêndoas produzidas é muito diferente e isso impossibilita a exportação para a
Europa. Então estamos trabalhando na tentativa de melhoria desses processos no
campo para obter amêndoas padronizadas e com boa qualidade”, disse a professora
Christelle.
Além das amêndoas, o trabalho no
Centro de Pesquisa vem analisando também cor, PH (grau de acidez, neutralidade
ou alcalinidade), identificação de compostos fenólicos (que tem efeitos
preventivos e curativos) e aromáticos, específicos para a saúde, o que é
responsável diretamente pelo preço e qualidade do produto. “Obter selo de
identificação geográfica, certificando o cacau paraense, é um dos nossos
maiores objetivos, para conquistar não só o primeiro lugar na quantidade, mas
também na qualidade. Essa integração entre agricultores e pesquisadores tem
dado certo e vamos continuar investindo para que melhorem cada vez mais os
processos”, avaliou a professora.
Além dos estudos da produção, os
resíduos que a fruta produz, como a casca, a película ao redor das sementes e o
líquido descartado pelo cacau, também estão sendo objeto de análise. “Na casca,
por exemplo, encontramos substratos para aquecimento de leveduras e fungos, ou
seja, um efeito antifúngico e antimicrobiano, combatendo doenças. Já a
película, que fica ao redor das sementes, leva a criação de um chá que se
imagina ter função medicinal, mas que segue em pesquisa; por fim, o mel do
cacau, líquido que era descartado, acredita-se que possa servir como inseticida
natural, inclusive no combate da vassoura de bruxa, principal praga que atinge
o cacau. Como se vê, é uma cultura em ciclo, onde tudo é aproveitado”,
especificou Christelle.
Para ela, o próximo passo, com a
análise sensorial sendo feita no Pará, será a redução de custo nas pesquisas,
tornando o processo mais rápido e eficaz, determinando a aceitabilidade e a
qualidade das amêndoas paraenses.