Sabe aquele desejo de transformar
a realidade por meio do trabalho de conclusão de curso? Pois é, foi assim que
surgiu a ideia do projeto experimental "Obtenção de lipases produzidas por
Streptomyces cinereus, utilizando o óleo residual de castanha-do-brasil como
indutor", de autoria da egressa do curso de Biotecnologia da Ufopa, Inaê
Ferreira. Sob a orientação das pesquisadoras Kelly Castro e Katrine Escher, a
inquieta Inaê Ferreira decidiu buscar alternativas de aproveitamento do resíduo
da indústria da castanha-do-brasil no município de Óbidos, no Oeste do Pará,
onde o produto é um problema ambiental, pois, segundo estudo, 70% da castanha
não são aproveitados.
Para os não iniciados, lipases
são enzimas que sintetizam lipídios, tais como óleos e gorduras. Já
Streptomyces cinereus é uma espécie de actinobactéria, isolada no solo.
Percebendo a grande perda de
amêndoas durante o processamento industrial das castanhas-do-brasil naquele
município, Inaê Ferreira pretendia buscar estratégias de aproveitamento
utilizando microrganismos nativos da Amazônia para agregar valor ao óleo obtido
da biomassa. "Antes de realizarmos toda a etapa de experimentos e ensaios
em laboratório, foi realizado um levantamento bibliográfico e também elaboramos
um questionário para sondar a estimativa do volume de resíduo gerado a partir
do que era produzido", conta.
Apesar de a região Norte apresentar
o maior percentual de produção e exportação dessas amêndoas, infelizmente,
lamenta a egressa da Ufopa, parte da castanha que é comercializada acaba sendo
comprometida pela contaminação de fungos produtores de micotoxinas, o que a
torna imprópria para consumo. "Na fase inicial dos estudos, ainda foi
verificado como era realizada a gestão de resíduos na própria indústria".
Agregando valor ao resíduo da
castanha-do-brasil
Com os dados em mãos e também com
as amêndoas não comercializadas doadas pela indústria de beneficiamento, a
Mundial Exportadora Comercial (Óbidos – Pará), Inaê deu início à fase
experimental do projeto, executado no laboratório P&DBio (Ufopa).
"Extraímos o óleo das amêndoas de castanha que seriam descartadas no
processamento industrial e, depois disso, o óleo foi caracterizado por
parâmetros físico-químicos. Já na segunda fase dos experimentos, realizada no
Laboratório de Microbiologia (Ufopa), foi executada toda a etapa enzimática e
microbiológica do trabalho.”
Dentre os microrganismos, as
actinobactérias são conhecidas pela produção de uma variedade de substâncias
bioativas, incluindo antibióticos e enzimas hidrolíticas. "Nós queríamos
saber se o óleo extraído poderia ser utilizado por bactérias do gênero Streptomyces
nativas da Amazônia, como substrato indutivo para a produção de lipase
microbiana. O interesse na obtenção da lipase produzida por microrganismos se
deu pela sua utilização como aditivo em alimentos, modificando e realçando suas
propriedades organolépticas, como também em detergentes, para hidrolisar
gorduras, no tratamento de efluentes oleosos, na indústria de cosméticos, e na
indústria química para a conversão de óleos em biodiesel", explica a
egressa.
Etapas – Após o ensaio preliminar
de detecção de lipase e posterior etapa de fermentação microbiana em meios
líquidos para verificar a atividade enzimática, confirmamos o potencial deste
substrato como excelente fonte de carbono e como indutivo nos meios de cultivo
estudados. "Nós verificamos que o óleo de castanha-do-brasil é uma
alternativa aos substratos sintéticos para a produção de lipases microbianas,
apresentando menor custo de produção, além de agregar valor a um resíduo da
agroindústria regional. Além disto, destacamos a importância biotecnológica da
bactéria Streptomyces cinereus, que foi isolada da microbiota amazônica, como
fonte de obtenção de lipases para aplicação industrial", destaca Inaê.
De acordo com a Profa. Katrine
Escher, atualmente a pesquisa continua com a etapa de caracterização química da
enzima, em parceria com os pesquisadores Raphael Ferrer e Leonor Alves, do
Departamento de Antibióticos da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
Na avaliação da biotecnologista
egressa da Ufopa, apesar de a castanha-do-brasil ter sido extensivamente
estudada e ser um grande desafio aos estudos inovadores sobre essa
matéria-prima, ainda há poucos relatos bibliográficos voltados para a
investigação do aproveitamento do óleo vegetal extraído de castanhas
deterioradas, sendo que esta foi a primeira vez que o óleo residual foi
utilizado para produção de lipase microbiana.
"Com os resultados junto à
actinobactéria, observou-se que o óleo do resíduo da castanha pode beneficiar
uma indústria de biocombustível, uma vez que ele se comporta como o indutor
comercial, favorecendo processos de uma química verde", conclui a Profa.
Kelly Castro.