Os primeiros 30 mil filhotes de tracajás
(Podocnemis unifilis), pitiús (P. sextuberculata) e tartarugas-da-amazônia (P.
expansa) da temporada 2020 do Programa Quelônios do Rio Trombetas (PQT)
nasceram até o momento na Reserva Biológica do Rio Trombetas (Rebio
Trombetas). As ações de manejo
reprodutivo desses quelônios são realizadas anualmente na região dos tabuleiros
do alto rio Trombetas e no Lago Erepecu, município de Oriximiná, no oeste do
Pará.
O PQT é desenvolvido pelo Instituto
Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) em parceria com a
Mineração Rio do Norte (MRN) e o Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ).
Também conta com a fundamental parceria de mais de 100 comunitários quilombolas
voluntários, totalizando 28 famílias, que trabalham na proteção, manejo e
monitoramento de ninhos, ovos e filhotes nos tabuleiros de desova.
Este ano, o modelo do programa precisou
ser readequado para atender as normas de segurança preventiva das autoridades
de saúde por conta da pandemia de covid-19. O número de praias protegidas
(chocadeiras) foi reduzido de 12 para 6. “Houve a necessidade de adaptação das
ações, principalmente no que se refere à participação dos comunitários
voluntários do programa. Essa redução não afetou o esforço da busca de ninhos e
a efetiva proteção dos quelônios. Mantivemos em funcionamento as chocadeiras
nas praias protegidas, onde as famílias voluntárias são residentes, evitando
que elas tivessem que deslocar suas residências para praias protegidas para não
ocorrer aglomeração de famílias diferentes em uma mesma área”, explica Marco
Aurélio da Silva, coordenador de pesquisa e monitoramento do Núcleo de Gestão
Integrada (NGI) do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
(ICMBio) Trombetas.
Tradicionalmente, os nascimentos dos
filhotes de tartaruga-da-amazônia, tracajá e pitiú ocorrem a partir de novembro
até o final de janeiro, dependendo da espécie na região do Tabuleiro e no Lago
Erepecu. “Não podemos prever números, mas, apesar dos desafios adicionais
impostos pela pandemia, esperamos para a temporada 2020-2021 um número maior de
nascimentos do que a média dos últimos anos devido a alterações que realizamos
em algumas áreas do PQT que viabilizaram a proteção de um número maior de
ninhos desses quelônios”, declara Marco Aurélio.
Os filhotes nascidos nas praias
protegidas são mantidos por 10 a 15 dias em cativeiro até serem liberados no
ambiente natural para que tenham maior capacidade de fuga dos predadores naturais,
aumentando, assim, a chance de sobrevivência dos quelônios no primeiro mês de
vida. Durante toda a temporada, os filhotes nascidos são liberados em pontos
estratégicos pelos agentes ambientais. Para os eventos de soltura,
demonstrativos das atividades do programa no final da temporada, em geral, são
reservados os últimos 10 mil filhotes a nascerem no ciclo de 2020.
Os eventos de soltura de grande porte
foram suspensos este ano para evitar aglomerações neste período da pandemia.
“Teremos apenas pequenas reuniões nas chocadeiras com um número menor de
voluntários para fazer uma soltura simbólica com eles. Vamos manter a soltura
gradual depois que os filhotes nascidos passarem 15 dias em cativeiro”, afirma
Silva.
Adaptações - Nessa temporada, as famílias
foram divididas em duas atividades: cuidadoras de chocadeiras e coletoras de
ninhos. Essas últimas percorreram praias onde são encontradas desovas naturais,
fizeram a coleta dos ovos e os levaram para as chocadeiras protegidas. Assim, o
contato entre famílias diferentes foi bastante minimizado. Nesse ano, além dos
tradicionais apoios de cesta básica de alimentos e víveres, combustíveis e
materiais próprios para a busca e coleta
de ninhos, também foi oferecido aos voluntários o kit covid com materiais de
proteção como máscaras, protetor facial, álcool em gel e itens de higiene.
As ações do PQT ocorrem em duas
frentes, a primeira pelos voluntários e a segunda frente pelo trabalho direto
dos agentes do ICMBio que fazem o monitoramento e proteção de algumas praias
com desovas naturais e também a busca e transferência dos ninhos em algumas
áreas. “Complementarmente existe a efetivação de rotina de fiscalização por
equipes de fiscais do ICMBio compostas de servidores provenientes de diversas regiões
do país, inibindo a coleta ilegal de ovos e a pesca de quelônios adultos
durante toda a temporada”, ressalta Silva.
Guardião de quelônios desde 1993, o
agente ambiental do ICMBio Antônio dos
Santos, conhecido como Sinho, da comunidade quilombola do Moura, em Oriximiná
(PA), comenta que a experiência neste ano de pandemia exigiu adaptação e maior
empenho da equipe do Instituto e dos voluntários, que contribuíram para manter
produtivo o ciclo de nascimento dos filhotes. “Para evitar aglomerações de comunitários
voluntários na Praia do Toró, tivemos que transferir a chocadeira que, nós,
oito agentes, cuidávamos na base do Santa Rosa para lá e, de forma revezada,
passamos a zelar pela praia. Achei que seria mais difícil ter produção boa,
mas, graças a Deus, é uma grande alegria verificar que os ovos dos filhotes já
eclodiram e nasceram. Outra satisfação é verificar que a maioria das pessoas
daqui estão interagindo com o programa e se conscientizando para proteger os
quelônios”, comemora.
Dedicação - Todos os voluntários do PQT
são das comunidades quilombolas residentes da Reserva Biológica do Rio
Trombetas como Último Quilombo, Nova Esperança do Lago do Erepecu e as
comunidades da região dos tabuleiros do alto rio Trombetas, que participam
ativamente. “É gratificante para a
Mineração Rio do Norte acompanhar o engajamento destes comunitários que,
mesmo apesar da pandemia, mantêm o compromisso com esse tão relevante programa
realizado em nossa região”, declara Genilda Cunha, analista de Relações
Comunitárias da MRN.
O PQT é um dos programas de
conservação de fauna mais antigos do Brasil. Iniciado na década de 80, esse
programa evitou a extinção das três espécies que são protegidas e soltas
anualmente na bacia do rio Trombetas. “O
PQT presta um relevante serviço de preservação dos quelônios, pois as
comunidades locais têm o programa como exemplo de conscientização sobre a
necessidade de conservação dos recursos naturais. A pandemia dificultou muito o
planejamento das ações do PQT, mas demonstrou aos seus participantes que a soma
de esforços entre comunidades, órgãos públicos, instituições de ensino e
pesquisa e da iniciativa privada é o mais importante para o sucesso de um
programa de conservação desse vulto”, conclui Marco Silva.