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Campanha para evitar o tráfico nos aeroportos - Fotos Wagner Almeida |
O Pará é um dos Estados que está na rota do tráfico de pessoas. Segundo o mapeamento feito pela Secretaria de Justiça e Direitos Humanos, Sejudh, os números são altos: de 2011 a 2014 foram registrados 70 casos de vítimas de tráfico de pessoas. Três regiões do Estado se destacam: Região Metropolitana de Belém, Xingu e Arquipélogo do Marajó. Neste ano de 2015, há registro de cinco vítimas do tráfico de pessoas. A maioria é de mulheres e adolescentes.
Leila Silva, coordenadora de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e Trabalho Escravo, vinculada à Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh/PA), ressalta que esses resultados são compartilhados com os dados das Polícias Civil e Militar. “Para mentalizar ações nessas regiões onde tem maior número de pessoas”, disse Leila. O tráfico de pessoas no Pará é chamado de “mão dupla”. Os escravizados deixam o Estado, como também são trazidos de outros lugares, principalmente atraídos pelos grandes projetos implantados no Estado.
Normalmente as vítimas são recrutadas de municípios que não possuem recursos financeiros. E ai que o traficante convence a pessoa. Oferece trabalho, melhor condição de vida, realização de sonhos. “A pessoa sempre quer alguma coisa, sonha, tem expectativas”, constata Leila. Geralmente, segundo a Sejudh, as vítimas são pessoas de baixa renda, mas a classe média e alta também é atingida, principalmente na rede de estudo no exterior.
Segundo a titular da coordenadoria, mulheres, crianças e adolescentes são as maiores vítimas. “A mulher pensa na família para sustentar e quer progredir na vida. Muitas vezes acabam aceitando propostas duvidosas. Para não cair nesse crime a pessoa deve ficar atenta e ver se essa oferta de emprego é muito fora do contexto, saber se a documentação é retida desde o local da viagem, se você tem que pagar valores altos pela alimentação, para beber água ou tomar banho. Até mesmo a compra da passagem, porque muitas vezes é tráfico internacional de pessoas”, alerta.
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Leila Silva, da sejudh-Pa, alerta sobre o tráfico de pessoas no Pará - Fotos Wagner Almeida/Sejudh |
Crime
O deputado federal Arnaldo Jordy (PPS-PA) afirmou que atua pelo enquadramento e tipificação penal do tráfico de pessoas. Ele, que é relator da comissão especial da Câmara e ex-presidente da CPI do Tráfico de Pessoas, revelou que no 1º semestre o projeto de lei (PL 7370/14) que define ações de prevenção e repressão ao tráfico de pessoas foi aprovado pela Câmara e está no Senado Federal. A expectativa é de que até o final do ano, passando pelo Senado, seja sancionado pela presidente Dilma Roussef.
“A CPI, que se encerrou no final do ano passado, produziu uma legislação e foi criada uma comissão especial. Essa comissão produziu um relatório que cria o projeto de lei já aprovado na Câmara dos deputados e agora está no Senado. Deve ser aprovado e espero que ainda este ano a presidente possa sancionar essa matéria, que é extremamente importante porque é uma tipificação jurídica que não há hoje. Hoje a legislação brasileira se ampara no Protocolo de Palermo, da Organização das Nações Unidas (ONU), referência mundial para o combate ao tráfico de seres humanos”, comenta Jordy.
Prevenir para não remediar
A defensora pública federal do Pará Rita Tomaz ressalta que esse problema deve ser enfrentado com políticas públicas sociais contra o tráfico de pessoas. Mesmo com o amplo acesso à informação, as pessoas ainda acabam caindo no golpe. Mas, segundo a defensora Rita Tomaz, a desinformação ainda é a maior causa. Ela vem atrelada a um contexto e tudo está ligado e relacionado e que dificulta a conscientização das pessoas da problemática do tráfico. As mulheres e crianças são as maiores vítimas, principalmente na exploração sexual.
A defensora pública do Estado, Felícia Fiúza, disse que o órgão tem o dever de alertar a sociedade para essa problemática, que é o trafico de pessoas. “Muitas vezes as pessoas se iludem, pensando que vão mudar de vida mas, na verdade, vão se deparar com uma realidade totalmente contrária”, disse a defensora. “Podemos ingressar com ações judiciais a de indenizações e danos morais contra o traficante”, conclui.
Há vários canais para a denúncia. Um deles é a Coordenadoria de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e Trabalho Escravo, na Sejudh. “Também pode procurar o serviço do Posto Avançado de Atendimento ao Imigrante, no aeroporto, e a rede de segurança. A pessoa também pode ligar para o disque 100, 180, 181, ou ir até a delegacia mais próxima”, informa.
Para o deputado Arnaldo Jordy, a dificuldade maior é a maneira como os traficantes se apresentam às vítimas. “É alguém que aborda moças desempregadas, com dificuldade para ter emprego. É alguém que se apresenta para adotar alguma criança pobre. Garotinho que tem a promessa de ser jogador de futebol. E promete que ele vai ganhar milhões. Como aconteceu com jovens no Pará. E nesse momento é importante prevenir. A prevenção só ocorre com muito debate e informação. Lembrar a data é uma forma de prevenir”, afirma.
Órgãos municipais, estaduais e federais estão unidos para combater o tráfico de pessoas em todo o Brasil. Essa mobilização faz parte da campanha intitulada Coração Azul, lançada pela Organização das Nações Unidas. Os números preocupam a sociedade. Dados da Divisão de Assistência Consular do Ministério das Relações Exteriores mostram que, em 2013, houve um total de 62 vítimas brasileiras no exterior. Dessas, 41 (66%) foram de tráfico para exploração sexual e 21 (34%), de trabalho escravo.
O tráfico de pessoas é o terceiro maior no mundo, perdendo apenas para drogas e armas, e movimenta bilhões por ano. Ele movimenta 30 bilhões de dólares por ano no mundo inteiro e milhões são vítimas. O Brasil está entre os 10 países que mais pratica esse crime.
Ainda segundo dados do levantamento do Ministério da Justiça, só no Brasil foram registrados 254 pessoas vítimas de tráfico humano, em 18 estados brasileiros, onde mais da metade levada para fins de exploração sexual, que é a principal atividade do tráfico de pessoas. Entre os estados brasileiros com o maior número de escravos estão São Paulo, com 184 casos, e Minas Gerais, com 29 pessoas.
Segundo o levantamento, em 2013 foram constatados, entre as unidades da Federação, registros de nove tipos de tráfico de pessoas ou crimes correlatos. Houve pelo menos um registro de entrega de filho ou pupilo (protegido ou afilhado), submissão de criança ou adolescente à prostituição ou à exploração sexual e remoção de órgãos, tecidos, ou partes do corpo humano. Os tipos mais comuns foram o tráfico para fins de exploração sexual, que respondeu por 134 do total de 254 casos, somando-se os crimes de tráfico interno e internacional (52,8% das ocorrências) e o trabalho escravo, que respondeu por 111 das 254 ocorrências registradas (43,7% das ocorrências).
Disque 100
Pelos dados do Disque 100 da Secretaria de Direitos Humanos (SDH), há uma concentração maior de mulheres do que de homens em todos os anos. O maior número de vítimas está nas faixas etárias correspondentes a crianças e adolescentes. Conforme as denúncias, a maior parte das vítimas era branca. Em seguida, vieram as pardas e pretas. No Ministério do Trabalho e Emprego, observa-se que, a partir de 2007, o número de pessoas resgatadas, em condições análogas à escravidão vem decrescendo. O número de trabalhadores imigrantes resgatados tem aumentado nos últimos anos.
O Sistema de Vigilância de Violências e Acidentes do Sistema de Informação de Agravos de Notificações do Ministério da Saúde apresenta informações semelhantes e revela que, na maior parte dos casos atendidos, as vítimas eram do sexo feminino e tinham até 29 anos de idade. Quanto às características dos traficantes, o sistema fornece informações sobre o sexo dos suspeitos de tráfico de pessoas e, de acordo com as notificações feitas pelas vítimas, em cerca de 80% dos casos, os agressores são do sexo masculino.
O relatório informa ainda que a Polícia Federal instaurou 343 inquéritos em 2013, não havendo alteração em relação ao ano de 2012, que teve 348 procedimentos policiais. De acordo com dados do Ministério Público Federal, no ano de 2013, foram registradas 30 denúncias e 24 ações penais sobre tráfico interno e internacional de pessoas para fins de exploração sexual.
Outro dado importante apresentado no relatório foi da Secretaria de Direitos Humanos (SDH) da Presidência da República que registra aumento de denúncias recebidas sobre tráfico de pessoas de 2011 a 2013, de 26 para 218, e quadruplicado entre 2011 e 2012. O número total de vítimas em 2013, de acordo com as denúncias feitas à secretaria, foi 309, cerca de dez vezes maior que o número de 2011 (32), e o dobro do ano anterior (170).
O que é o Tráfico de Pessoas
O Tráfico de Pessoas é como um comércio de seres humanos. Acontece quando a pessoa é levada a uma situação de exploração, mesmo que, de início, tenha concordado. O tráfico pode acontecer para vários fins: exploração sexual, trabalho equivalente ao de escravo, extração de órgãos humanos, adoção ilegal e vários outros.
Como prevenir?
Antes de aceitar ofertas de trabalho, procure conhecer seus direitos como trabalhador e as condições de trabalho oferecidas.
Prefira ofertas de emprego de instituições formalmente reconhecidas.
Não entregue documentos pessoais de identificação a ninguém. Além do documento original, tenha sempre uma cópia em mãos.
Deixe contatos telefônicos e endereço com familiares e amigos.
Disque 100 ou Ligue 180
*#Reportagem escrita para revista Pará Mais - Menção Honrosa do Prêmio Sobre Trabalho Sexual e Exploração Sexual, promovido pelo Emaus.