Localizada na
porção sul do Pará, nos municípios de Altamira e São Félix do Xingu, a Estação
Ecológica da Terra do Meio (Esec-TM) é marcada por riquezas naturais e
históricos de conflitos. Para contribuir com a gestão desse território e com o
reconhecimento dos direitos sociais das populações que vivem nele, cientistas
estudam a biodiversidade e o legado arqueológico da Terra do Meio. "É a
primeira vez que uma equipe de arqueólogos sobe o rio Iriri (rio que cruza a
estação ecológica)", informa Márcio Amaral, do Laboratório de Arqueologia
do Instituto Mamirauá que integra o projeto.
As viagens
científicas à região acontecem desde 2016 e já renderam resultados
significativos para entender as antigas ocupações humanas na Terra do Meio e
como elas ajudaram a moldar a paisagem atual.
"Temos
uma possibilidade muito boa de tentar reconstruir esse passado arqueológico que
vem desde ocupações bem antigas, de antigos povos indígenas", disse
Márcio. "Foram encontradas pontas de lança, muitas gravuras rupestres,
material cerâmico mais recente e áreas de manejo interessantes para pensarmos
como essas pessoas estavam manejando o ambiente".
Márcio Amaral
aponta que a influência de antigos povos nessa parte da Amazônia não se
manifesta apenas na floresta, com a presença de espécies vegetais de cultivo
ancestral, mas também nas águas da região. "Detectamos inúmeros currais de
pesca que eram usados para aprisionar peixes que circulavam pelo rio em
determinada época do ano, era uma reserva de proteína para esses povos".
Os
pesquisadores Vinícius Honorato e Bruna da Rocha, da Universidade Federal do
Oeste do Pará (Ufopa) também conduziram o levantamento arqueológico.
Ciência a serviço
da cidadania e conservação
As pesquisas
são fruto de uma parceria do Instituto Socioambiental (ISA) com centros de
ciência nacionais e estrangeiros. Os dados coletados na Estação Ecológica da
Terra do Meio vão compor um laudo pericial que vai avaliar a situação de
famílias ribeirinhas no interior da Esec e as possibilidade de compatibilizar a
permanência delas com os princípios da unidade de conservação.
Dezenas de
famílias ribeirinhas vivem nos mais de 3 milhões de hectares da estação
ecológica, apesar da habitação humana ser proibida nessa área de proteção
integral, o que é motivo de impasse entre as comunidades e os órgãos
ambientais.
O seminário
técnico "Direitos territoriais e estratégias de sustentabilidade
envolvendo povos e comunidades tradicionais na Estação Ecológica da Terra do
Meio" será realizado nos próximos dias 30 de novembro e 1º de dezembro no
Centro de Formação Bethânia em Altamira, no Pará, e vai compartilhar os
resultados preliminares do projeto.
"O
levantamento arqueológico aponta ocupação humana densa e secular no interior da
Esec-TM e sugere que parte significativa da floresta é antropogênica, isto é, a
estrutura e a composição das espécies da floresta mostram sinais das
intervenções das populações pré e pós colombianas que ali viveram",
adianta a coordenação do Instituto Socioambiental (ISA). "Em articulação
com a caracterização socioeconômica e antropológica, esses resultados aventam
uma reavaliação das premissas da legislação sobre áreas protegidas, no sentido
da compatibilização de certas formas de ocupação com categorias mais
restritivas de unidades de conservação ambiental".
Texto: João
Cunha