Com mais acesso à informação cresce o número de mulheres que denunciam as violências sofridas


A violência contra a mulher é um ato bárbaro que ocorre há séculos. Antes, a sociedade pouco denunciava esse tipo de violência. Hoje, a maioria da população já entende que se trata de um crime e que o agressor precisa ser denunciado e punido. Atualmente, a principal lei de proteção da mulher é a Lei Maria da Penha. Criada em setembro de 2006, a lei traz mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, como a aplicação de Medidas Protetivas de Urgência que obrigam o agressor (art. 22), a exemplo do afastamento do lar e da proibição de aproximação e contato com a ofendida e seus familiares.

A lei ainda promoveu a alteração do Código Penal, para punir de forma mais rigorosa a Lesão Corporal cometida em âmbito doméstico, com pena de detenção, de 3 meses a 3 anos (art. 44).

Para a promotora de Justiça e coordenadora do Núcleo de Enfrentamento à Violência contra a Mulher do Ministério Público do Pará, Lucinery Resende, a violência ocorre devido a uma criação marcada pela cultura machista. De acordo com a promotora “é destinado ao homem um papel social de comando, onde todos dentro do lar devem obedecer e respeitar. Com base nisso, o pai, o avô, o irmão, sentem-se donos das mulheres daquela família e determinam o que elas podem ou não fazer. E essa cultura machista, em algumas famílias, se manifesta através de violência física e psicológica. É algo tão arraigado no senso coletivo, que muitas mulheres nem percebem que estão num quadro de violência psicológica”, diz a promotora.

Lucinery Ferreira explica que existem vários tipos de violência contra a mulher, que partem desde o caráter verbal, psicológico e moral, ao abuso físico, sexual e patrimonial. Abusos esses que podem culminar na última e mais gravosa esfera de controle e violência, o feminicídio (homicídio de mulheres em um contexto de gênero). Número de inquéritos que chegam ao MPPA registrou aumento

Segundo Lucinery Resende, o aumento das estatísticas de violência decorre do maior acesso à informação por parte das vítimas. Segundo a promotora, as mulheres que estavam caladas e não sabiam em qual porta bater, descobriram que existem a delegacia da mulher, a promotoria da mulher, a defensoria da mulher e que não precisam mais ter medo, pois existe uma lei e a justiça está ao lado delas.

Prova disso é que, segundo dados do Núcleo de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher, os números de inquéritos policiais que chegam ao Ministério Público aumentaram de 1.261 em 2015 para 1.347 em 2016.

Número de inquéritos policiais que chegam ao MPPA aumentou

O acesso à informação tem um grande reflexo no aumento de providências contra o abuso e violência. Para Lucinery Resende isso pode ter inibido alguns homens. “Os homens hoje, mesmo em tom de brincadeira dizem: ‘olha cuidado que a lei Maria da Penha te enquadra’. Essa brincadeira, aparentemente inocente, na verdade é uma concepção social estabelecida. As pessoas sabem que existe uma lei mais rigorosa e a temem”, diz a promotora.

"Contudo, alguns homens ainda não enxergam isso. Eles têm uma cultura machista tão arraigada, a concepção de que a mulher é um objeto, que pode ser possuída, que fica difícil de corrigir essa distorção. É aquele homem que acaba cometendo loucuras, matando até na frente da família e de autoridades. É o que chamamos de feminicídio, que é considerado o último estágio de violência", explica a representante do MPPA.

Em Belém, segundo dados do Núcleo da Mulher do MPPA, no ano de 2016 o Ministério Público registrou na capital um total de 3.811 procedimentos de violência contra a mulher. Os dados incluem desde ações penais à inquéritos policiais e medidas protetivas e podem ser encontrados no site do Ministério Público no link do Centro de Apoio Operacional/Núcleo de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher.

 MPPA integra Rede de Cooperação do Pro Paz

Além de coordenadora do Núcleo da Mulher, Lucinery Rezente também atua junto ao Pro Paz Mulher - que faz parte do Pro Paz Integrado - criado para oferecer um serviço especializado de atendimento integral, qualificado e humanizado às mulheres em situação de violência doméstica, familiar e sexual, de maneira a promover sua cidadania e evitar sua revitimização.

O atendimento especializado do Pro Paz Mulher chega ao interior do estado através de seis núcleos distribuídos nas regiões do Xingu (Núcleo de Altamira), Guajarina (Núcleo de Paragominas), do Lago de Tucuruí (Núcleo de Tucuruí), Baixo Amazonas (Núcleo de Santarém), Bragantina (Núcleo de Bragança) e no Marajó (Núcleo de Breves), além de contar com o apoio das unidades da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, localizadas em todas as regiões do Pará.

Equipe do MPPA em atuação no Pro Paz   Dentro do Pro Paz o Ministério Público possui uma equipe de atendimento, que conta com psicóloga e um quadro de estagiários, e que atuam em cooperação com a Defensoria Pública e Judiciário. Para a promotora o Pro Paz Mulher é a casa da vítima, onde a mesma pode receber um atendimento multidisciplinar e especializado, com acesso à perícia, atendimento psicólogo, jurídico e assistencial. Ele possui uma completa rede de atendimento, que facilita a denúncia e o acolhimento das vítimas.

“Se ela foi machucada e precisa fazer um exame de corpo de delito é lá que ela vai fazer. Não precisa mais fazer aquela peregrinação, que se fazia antes: pega o ônibus, vai para Augusto Montenegro fazer corpo de delito, volta para a delegacia, depois vai lá na praça Felipe Patroni atrás do promotor do caso. Agora não, todos os serviços concentrados num só lugar”, diz Lucinery.

Desde a criação da lei Maria da Penha, o Pro Paz Mulher tem envidado esforços para proporcionar à vítima de violência um atendimento especializado, de forma que, quem for atendê-la, homem ou mulher, esteja preparado e sensível ao problema. “Ela precisa ser muito bem acolhida, muito bem recebida e ser encorajada a falar”, explica a promotora.