O Ministério Público Federal (MPF) em
conjunto com cinco organizações da sociedade civil enviaram, na segunda-feira
(19), representação ao Tribunal de Contas da União (TCU) pedindo a suspensão
cautelar do processo de desestatização e a proibição da licitação da Ferrogrão,
ferrovia projetada para cortar os estados do Mato Grosso e do Pará, entre os
municípios de Sinop e Itaituba, com potencial impacto sobre 48 territórios de
povos indígenas. O governo brasileiro se recusa a realizar consulta aos povos
afetados, mesmo tendo recebido pelo menos oito pedidos de associações
indígenas, duas recomendações do MPF e depois de ter se comprometido a
respeitar o direito de consulta prévia, livre e informada previsto na Convenção
169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
“A legitimidade do pleito dos povos
indígenas e comunidades tradicionais pelo cumprimento de seus direitos de
Consulta e Consentimento Livre, Prévio e Informado acerca dos efeitos regionais
da ferrovia na etapa de planejamento do projeto ferroviário é inquestionável e
precisa ser atendido com urgência dado que o processo de concessão já se
encontra em análise pelo TCU”, diz a representação assinada pelo MPF, Instituto
Socioambiental (ISA), Associação Iakiô, do povo Panará, Associação da Terra
Indígena do Xingu (Atix), Instituto Raoni, do povo Kayapó, e Instituto Kabu, do
povo Kayapó Mekragnotire.
A Agência Nacional de Transportes
Terrestres (ANTT), responsável pelo projeto da ferrovia, assumiu o compromisso,
em audiência pública e por escrito, de realizar a consulta prévia aos indígenas
antes de enviar o processo de concessão da Ferrogrão ao TCU para análise. O
compromisso foi assumido pelo então presidente da ANTT, Alexandre Porto, que
disse, durante audiência em Brasília, em 12 de dezembro de 2017, que o governo
iria “obedecer o que a Organização Internacional do Trabalho exige, de ser
feita as consultas prévias a todos os povos indígenas para buscar o
consentimento, só então, concluído todo este trabalho, é que pensa-se em um
eventual protocolo no Tribunal de Contas”. Posteriormente, o compromisso foi
reiterado em documento que consta do processo de concessão.
As consultas nunca foram realizadas e no
dia 13 de julho de 2020 o Ministério da Infraestrutura encaminhou para análise
do TCU o processo de concessão da Ferrogrão, também chamada EF-170. Ao mesmo
tempo, também tramita o processo de licenciamento ambiental da ferrovia junto
ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) e há previsão para que a licitação
da estrada seja feita no final do ano, com emissão de licença prévia no
primeiro semestre de 2021. O planejamento governamental desconsidera totalmente
os impactos sobre os indígenas, que já foram detectados pelos primeiros
levantamentos, e viola direitos reconhecidos nacional e internacionalmente
desses povos.