Futebol de Cinco eleva a auto-estima de deficientes visuais



Rodrigo Almeida afirma que o futebol mudou o seu jeito de enxergar o mundo. Toda quinta e sábado, na quadra da Universidade do Estado do Pará, ele se reúne com seus colegas para praticarem o esporte, principalmente o futebol de salão. Todos são deficientes visuais. Uns com baixa visão, outros totalmente cegos. “Fui perdendo a visão aos poucos e no começo entrei em total depressão. Mas Deus escreve algo em nossas vidas, uma missão. E a minha era mostrar que o deficiente pode tudo. Não somos limitados”, disse ele.

Rodrigo afirma que o relacionamento com os colegas é muito bom. “Aqui ninguém é coitado e quem chega tem que rapidamente se virar. Claro que temos as limitações, mas temos que saber superá-las”, disse Rodrigo, que reclama da falta de acessibilidade para deficientes em Belém. As faixas guias, colocadas nas calçadas, são alvos de reclamações. “Quem fez aquilo não entende de nada. No caminho da faixa estão postes, camelôs e até bancas de jornal e revista”, disse ele, que já perdeu as contas de quantas vezes caiu num bueiro.

Ricardo Xerfan também não perde o compromisso de jogar o Futebol de 5. Para ele, que participa há 35 anos do futebol, o esporte o ajuda na mobilidade e na habilidade. “Ajuda muito em nossa capacidade. E não nos sentimos jogados. Fazemos o que gostamos. Temos outros esportes que podemos desenvolver também, como dama e xadrez”, disse.


Futebol de 5




Há relatos de que no Brasil, na década de 1950, cegos jogavam futebol com latas. Em 1978, nas Olimpíadas das APAEs, em Natal (RN), ocorreu o primeiro campeonato de futebol com deficientes visuais. A primeira Copa Brasil foi em 1984, na capital paulista. Das quatro edições da Copa América, os brasileiros trouxeram três ouros: Assunção (1997), Paulínia (2001) e Bogotá (2003).

Em Buenos Aires (1999), o título não veio, mas os brasileiros venceram os argentinos. Em 1998, o Brasil sediou o primeiro Mundial de futebol e levou o título. Dois anos depois, em Jerez de la Frontera (ESP), a Seleção se sagrou campeã novamente.

Como é disputado

O futebol de 5 é exclusivo para cegos ou deficientes visuais. As partidas normalmente são em uma quadra de futsal adaptada, mas desde os Jogos Paralímpicos de Atenas também têm sido praticadas em campos de grama sintética. O goleiro tem visão total e não pode ter participado de competições oficiais da Fifa nos últimos cinco anos.

Junto às linhas laterais, são colocadas bandas que impedem que a bola saia do campo. Cada time é formado por cinco jogadores – um goleiro e quatro na linha. Diferentemente de um estádio convencional de futebol, as partidas de futebol de cinco são silenciosas, em locais sem eco.

A bola tem guizos internos para que os atletas consigam localizá-la. A torcida só pode se manifestar na hora do gol. Os jogadores usam uma venda nos olhos e, se tocá-la, cometerá uma falta. Com cinco infrações, o atleta é expulso de campo e pode ser substituído por outro jogador.

Há ainda um guia, o chamador, que fica atrás do gol, para orientar os jogadores, e que diz onde devem se posicionar em campo e para onde devem chutar. O jogo tem dois tempos de 25 minutos e intervalo de 10 minutos. No Brasil, a modalidade é administrada pela Confederação Brasileira de Deportos de Deficientes Visuais (CBDV).



Brasil nos Jogos

A modalidade passou a fazer parte dos Jogos Paralímpicos na edição de 2004, em Atenas (GRE). Desde então, o Brasil faturou a medalha de ouro em todas as ocasiões. Na estreia, a decisão foi contra os rivais argentinos. A Seleção ficou com o topo do pódio ao bater os sul-americanos por 3 a 2.

Na edição seguinte, em Pequim (China), a briga pela láurea dourada se deu contra os donos da casa. Em partida disputada, o Brasil ficou com o bicampeonato ao batê-los por 2 a 1. A hegemonia verde e amarela seria consolidada quatro anos mais tarde, nos Jogos Paralímpicos de Londres.  A terceira conquista consecutiva ocorreu após o triunfo por 2 a 0 sobre os franceses, em jogo na capital britânica.

Os Jogos Paralímpicos, esta modalidade é exclusivamente praticada por atletas da classe B1 (cegos totais) que não têm nenhuma percepção luminosa em ambos os olhos; ou têm percepção de luz, mas com incapacidade de reconhecer o formato de uma mão a qualquer distância ou direção.

Os atletas são divididos em três classes que começam sempre com a letra B (blind, cego em inglês).

B1 – Cego total: de nenhuma percepção luminosa em ambos os olhos até a percepção de luz, mas com incapacidade de reconhecer o formato de uma mão a qualquer distância ou direção.
B2 – Jogadores já têm a percepção de vultos. Da capacidade em reconhecer a forma de uma mão até a acuidade visual de 2/60 e/ou campo visual inferior a 5 graus.
B3 – Os jogadores já conseguem definir imagens. Da acuidade visual de 2/60 a acuidade visual de 6/60 e/ou campo visual de mais de 5 graus e menos de 20 graus.


Celso Freire/Revista Pará Mais