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Foto: Eunice Venturi - Divulgação |
Em períodos de vigilância dos
ninhos, as fêmeas de jacaretinga resistem por longos períodos sem alimentação,
consumindo preferencialmente presas que estão próximas ao ninho. Esse é um dos resultados apontados por
pesquisadores no artigo divulgado recentemente no periódico científico
internacional Herpetological Journal, da Sociedade Britânica de Herpetologia.
O estudo, realizado na Reserva
Piagaçu Purus, que fica a cerca de 350 km de Manaus (AM), avaliou as diferenças
entre a dieta de fêmeas desta espécie de jacaré amazônico (Caiman crocodilus)
em período de incubação dos ovos e fêmeas fora desse período.
A pesquisa aponta que o momento
de reprodução, associado ao comportamento de acompanhamento do ninho,
influencia na composição da dieta das fêmeas, ou seja, na escolha das presas
para alimentação, assim como na frequência da alimentação durante a incubação
dos ovos.
"A composição da dieta
destas fêmeas difere significativamente de outras fêmeas não nidificantes (que
não constroem ninhos). Acreditávamos que, na época de nidificação, as fêmeas,
que investem uma grande quantidade de energia na vigilância e cuidado dos ninhos,
usando reservas internas de energia. O que pode acontecer com outras espécies
também", comentou Robinson Botero-Arias, pesquisador do Instituto Mamirauá
- unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e
Comunicações.
O conteúdo estomacal de 33 fêmeas
encontradas vigiando os ninhos e de 16 fêmeas capturadas em locais sem ninhos
foram coletados em expedição de campo na Amazônia. Os animais foram pesados,
medidos e marcados pelos pesquisadores, e o conteúdo estomacal foi obtido após
lavagem estomacal, para análise posterior em laboratório. Após o procedimento,
as fêmeas de jacaré foram soltas no mesmo ambiente em que foram capturadas.
Na análise do material foram
identificadas 206 presas, sendo a maioria delas de invertebrados terrestres,
representando 70% do total, 15% foram peixes, 8% moluscos, 5% invertebrados
aquáticos e 2% de outros vertebrados.
"As fêmeas no ninho se
alimentaram com as presas disponíveis próximo a seu entorno. E esta
disponibilidade é diferente para as fêmeas não nidificantes, as que talvez
tenham mais opções de presas. Por isso, 70% da composição da dieta das fêmeas
nidificantes é de invertebrados", explicou o pesquisador. Entre os
invertebrados terrestres, estão besouros, gafanhotos e cigarras. A principal diferença
apontada no estudo foi nas presas aquáticas, como peixes, moluscos e besouros
aquáticos, mais presentes em fêmeas sem ninhos.
Jacarés amazônicos - Robinson
destaca que ainda são escassos os estudos sobre dieta e hábitos alimentares de
fêmeas de jacarés amazônicos, especialmente em período reprodutivo. De acordo
com o pesquisador, o cuidado parental de ninhos e filhotes é um comportamento
característico entre os crocodilianos, como uma estratégia das fêmeas para
garantir a sobrevivência dos filhotes. Esses animais se adaptam bem às
condições ambientais e possuem hábito alimentar oportunista.
"Fisiologicamente, eles
podem se adaptar a momentos de baixas disponibilidades de alimento, associado à
capacidade de armazenarem energia em forma de gordura, quando o alimento está
disponível. Por este motivo, de um ponto de vista da saúde, os animais, em
especial as fêmeas nidificantes, podem enfrentar períodos longos sem se
alimentar, mas sem afetar suas condições físicas e seu bem-estar",
explicou Robinson.
O período reprodutivo desses
animais é influenciado pelo ciclo dos rios, a construção dos ninhos ocorre
durante a vazante, que geralmente inicia em setembro, como explica o
pesquisador. Para a espécie contemplada na pesquisa, a Jacaretinga, o período
de incubação dos filhotes dura entre 60 e 70 dias, e a mãe acompanha e protege
seus filhotes por mais de um ano.
Conservação - Robinson destaca
que a pesquisa contribui para o conhecimento sobre a biologia e ecologia da
espécie e pode ajudar no desenvolvimento de estratégias de conservação para o
animal ou a área que habita. "Esta informação, por exemplo, reforça a
vulnerabilidade das fêmeas num momento importante dentro do processo de
dinâmica populacional. Por isso, é importante, quando pensamos em áreas protegidas
(unidades de conservação) como as Reservas Mamirauá ou Piagaçu Purus, ter estas
informações para o estabelecimento de áreas de preservação, por exemplo",
completou o pesquisador.
Além de Robinson Botero-Arias,
também assinam o artigo os pesquisadores José Antônio Lemos, da Universidade de
Aveiro (Portugal), Boris Marioni e Diogo Dutra-Araújo, do Instituto Piagaçu,
Antonio Nogueirado Centro de Estudos do Ambiente e do Ar (Portugal), William
Magnusson, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia e Ronis da Silveira,
da Universidade Federal do Amazonas.