Expedição científica, uma parceria do Instituto Mamirauá e WWF-Brasil, fez testes para refinar o emprego da tecnologia na contagem dos golfinhos de água doce |
Cento
e dez quilômetros voados sobre rios e lagos na Amazônia. Cinquenta vídeos
gravados, tomadas aéreas com cenas inéditas de observação e comportamento de
botos, somando mais de dez horas de material para análise. Pesquisadores do
Instituto Mamirauá e do WWF-Brasil concluíram a
segunda expedição para testar a contagem de botos amazônicos com uso de drones.
Por
cinco dias, eles percorreram longos trechos na extensão e entorno do rio
Jarauá, no interior das Reservas de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá e
Amanã, estado do Amazonas. A região é morada de botos-vermelhos (Inia
geoffrensis) e tucuxis (Sotalia fluviatilis), focos da pesquisa. No período,
foi registrada mais de uma centena de observações de botos, unindo a contagem
tradicional com a captação de imagens por drones.
"Para
a pesquisa, o uso de drones é um avanço muito grande, que tem facilitado e tornado
muito mais ágil a obtenção de resultados sobre os botos", considera Miriam
Marmontel, líder do Grupo de Pesquisa em Mamíferos Aquáticos da Amazônia do
Instituto Mamirauá.
Habitantes
de águas turvas, os botos amazônicos são difíceis de serem vistos e estudados
em natureza. As aparições na superfície, momento em que respiram, são rápidas e
mostram somente partes de sua anatomia. Frustação para espectadores comuns e um
enorme desafio para os pesquisadores, mesmo os mais experientes, na missão de
entender e planejar estratégias de conservação para esses animais.
Para
filmar, de cima, o habitat dos golfinhos de água doce, os drones se apresentam
como uma alternativa tecnológica viável para
as atividades de contagem e monitoramento das espécies. Possibilidade
cada vez mais concreta com o avanço dos testes feitos em parceria pelo
Instituto Mamirauá - unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia,
Inovações e Comunicações - e WWF-Brasil.
O
especialista em conservação do programa Amazônia do WWF-Brasil, Marcelo
Oliveira, aponta que o "ponto-chave dessa expedição foi refinar a
metodologia de uso de drones, o que conseguimos depois de muitos testes,
discussões e voos com o equipamento, que mostraram na prática o que
funciona".
Como
funciona o método
A
bordo de pequenos e velozes barcos a motor, popularmente conhecidos como
"voadeiras", a equipe fez novos testes para contar botos em trechos
de rio. Em uma voadeira, vão os observadores: dois na proa (a parte da frente
do barco) e um na popa (a parte de trás). São eles os responsáveis por olhar e
registrar avistamentos de botos, que é a maneira tradicional de contagem, a 100
metros de uma das margens do rio.
Do
alto, a 20 metros acima das cabeças dos pesquisadores, sobrevoa o drone, cujo
controle é feito por outra equipe em uma segunda voadeira. Seres humanos e
máquina cumprem juntos um trajeto de dois quilômetros ao longo da margem,
chamado de "transecto", em tempo e velocidade iguais. Cada teste dura
em média treze minutos, quando é feito o pouso e a troca de bateria do drone e
tem começo um novo transecto.
"Estamos
fazendo um experimento mais controlado, para tentar utilizar as imagens do
drone como um fator de correção do
método tradicional, que a gente usa para estimativa populacional de
tucuxis", diz a pesquisadora do Instituto Mamirauá, Daiane da Rosa e uma
das organizadoras das expedições. "Essa tecnologia pode elucidar alguns
pontos que, durante a observação, nós não conseguimos. Como a formação de
grupos de botos, qual é o tamanho daquele grupo, se duas ou três observações
vistas pela proa podem ser ou não o mesmo grupo de indivíduos".
Ecodrones
Os
testes fazem parte do projeto Ecodrones, que utiliza as aeronaves não
tripuladas para monitoramento de vida silvestre em diversas regiões do Brasil.
Na Amazônia, a investigação com botos é pioneira e mira em um problema para a
conservação das espécies: a carência de dados sobre densidade e a abundância
desses animais.
Na
Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da União Internacional para a Conservação da
Natureza (em inglês, IUCN), o tucuxi e o boto vermelho aparecem como
"dados insuficientes", pela falta de informações como estimativas
populacionais e taxas de mortalidade e natalidade.
Parceria
internacional
A
pesquisadora Miriam Marmontel ressalta a necessidade de desenvolver e difundir
o uso de novas tecnologias, como os drones, nas pesquisas com botos em outras
partes da Amazônia. "Não basta olhar um rio e fazer uma estimativa para a
Amazônia inteira. São várias regiões que tem que ser amostradas pra gente ter
um dado geral da estimativa. É uma informação muito importante para saber o
status de conservação das espécies", diz.