Missão do Conselho Nacional dos Direitos Humanos verifica atendimento a imigrantes venezuelanos no Pará



O Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) enviou missão que está percorrendo três estados da Amazônia Brasileira – Pará, Amazonas e Roraima – verificando o atendimento a imigrantes venezuelanos. Nos dias 18, 19 e 20 de janeiro, os conselheiros visitaram Belém e Santarém, no Pará, conversaram com autoridades municipais e estaduais e com indígenas Warao nas duas cidades. A programação incluiu reunião com o prefeito de Belém, Zenaldo Coutinho, com o governador do estado, Simão Jatene e com o prefeito de Santarém, Nélio Aguiar.

Todas as reuniões e vistorias feitas pela missão do CNDH na Amazônia comporão depois um relatório, com as conclusões e recomendações para a situação dos imigrantes venezuelanos. Um dos possíveis resultados é a construção de um protocolo de atuação que poderá ser aplicado por todos os estados brasileiros que recebam imigrantes em situação de vulnerabilidade, especialmente indígenas. Uma das principais dificuldades até agora, diante do ineditismo da situação, é assegurar o respeito às tradições culturais da etnia Warao, bem como observar as previsões da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, que preconiza, por exemplo, o direito à consulta prévia.

Em Belém, estima-se a presença de 100 indígenas Warao. Parte deles estava vivendo em situação precária ao lado do mercado do Ver-O-Peso, mas no dia em que a missão do CNDH chegou, 19, eles foram transferidos para um abrigo mantido pelo governo do Pará. Entre as principais preocupações registradas pela missão na capital paraense, estão a dificuldade de emissão de documentos e carteiras de trabalho, para os indígenas que solicitem, e a dificuldade de assegurar o abrigamento adequado a todos – até agora, os abrigos ofertados na capital paraense foram provisórios e, em alguns aspectos, bastante precários.

“Percebemos a dificuldade de diálogo entre as três esferas de governo, mas temos que examinar a atuação estatal como um todo”, esclareceu João Akira Omoto, Procurador Federal dos Direitos do Cidadão adjunto e representante do Ministério Público Federal no CNDH. “O Estado brasileiro em conjunto precisa assegurar o atendimento dos imigrantes, sob pena de responsabilização internacional, em caso de violações de direitos humanos dos imigrantes. Foi o que viemos verificar”, explicou. O prefeito de Belém, Zenaldo Coutinho, ressaltou a importância do trabalho coordenado entre as três esferas de governo, prefeituras, estados e o governo federal.

“Questões de imigração são complexas porque elas envolvem uma dinâmica muito fluida, ainda mais no caso dos venezuelanos, que em geral chegam com alto grau de vulnerabilidade. São vários os aspectos dos direitos humanos que preocupam o CNDH”, disse Camila Asano, integrante da missão, coordenadora de programas da ONG Conectas Direitos Humanos e representante da Conectas no CNDH. Por isso, as reuniões com autoridades locais incluíram a participação de servidores das áreas de saúde, educação e assistência social.

Joana Lima, da Cáritas Brasileira Regional Norte 2, organização da sociedade civil que acompanha a situação dos imigrantes na capital paraense desde que chegaram a Belém, afirmou que a ida do CNDH a Belém trouxe resultados que aguardavam há seis meses. “O abrigamento dos Warao, as providências com relação à saúde e à documentação foram os encaminhamentos mais importantes da missão”, explica Lima, que reclamou da omissão dos gestores locais em relação ao caso. “Isso só nos mostrou que a Prefeitura, o Governo do Estado, todos eles poderiam ter feito isso lá atrás. Poderiam, há meses, ter elaborado um plano emergencial, algo dentro dos seus limites jurídicos, dentro da sua competência, para o atendimento desses indígenas”, protesta.

Ativista do Instituto Brasil Amigo e integrante do Conselho Estadual de Justiça e Direitos Humanos do Estado do Pará, Jonathan Sousa também avalia os efeitos positivos da missão, e ressalta, dentre os compromissos assumidos pelo Governo do Estado e pela Prefeitura, a emissão de Carteira de Trabalho para os venezuelanos, que deve acontecer ainda nesta semana.  “A Carteira de Trabalho garante, além de identificação, maior possibilidade e um meio de formalização para inclusão no mercado de trabalho”, pontua o conselheiro.

Projeto para solicitação de verbas federais – A prefeitura e o governo paraense estão elaborando projeto para envio ao Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) solicitando a alocação de verbas federais específicas para o atendimento dos imigrantes venezuelanos. Em Belém, de acordo com informações prestadas pela Secretaria de Saúde, todos os indígenas estão sendo atendidos regularmente pelo consultório de rua, todos foram vacinados e possuem o cartão do Sistema Único de Saúde.

Um desafio para a prefeitura é a educação das crianças Warao que estão na cidade, já que o município de Belém não tem experiência em educação escolar indígena. “No caso da educação, a experiência com os Warao vai impor a criação de uma política pública inédita e específica para o contexto deles”, disse o secretário de educação Marcelo Mazolli.

Desafio também foi o termo usado pelo governador do Pará, Simão Jatene, durante a reunião com a missão do CNDH. “Precisamos pensar fora da caixa e ser flexíveis para encarar essa questão com a seriedade com que ela precisa ser encarada. O Estado está absolutamente interessado em assegurar todos os direitos que essa população merece ter, mas temos que avaliar como fazer isso. A política pública que temos hoje talvez precise ser adequada à realidade deles”, disse.

Santarém – No município de Santarém, a cerca de mil, quilômetros de Belém, chegaram entre 100 e 120 indígenas Warao. A missão do CNDH esteve na cidade no dia 20 de janeiro, fez reunião com o prefeito, Nélio Aguiar, e secretários municipais e também visitou o abrigo onde estão os imigrantes. "O estado Brasileiro não está preparado para lidar com esse fluxo migratório. São notórios os esforços que o município de Santarém, o prefeito e sua equipe tem feito para atender os imigrantes venezuelanos. Nós não temos RELATOS DE nenhum imigrante venezuelano em situação de rua, o que é bastante louvável, pois não era realidade dos outros municípios. Evidentemente há problemas nos abrigos, mas há um esforço no sentido de resolver e a gente pretende orientar e fazer recomendações no sentido de que as correções sejam realizadas”, disse João Akira Omoto após visitar o abrigo.


Nos próximos dias, a missão do CNDH visita Manaus, no Amazonas, Boa Vista e Pacaraima, em Roraima, estado que recebeu a maior parte dos imigrantes venezuelanos. Compõem a missão os conselheiros João Akira Omoto, representante do Ministério Público Federal (MPF) no Conselho, Camila Asano, representante da Conectas Direitos Humanos e João Chaves e Roberta Alvim, da Defensoria Pública da União (DPU). O chefe da missão da Organização Internacional para as Migrações (OIM) no Brasil, Stéphane Rostiaux, também acompanha o trabalho.