Sob coordenação da professora
Sílvia Katrine Escher, a equipe do Laboratório de Microbiologia (LabMicro) da
Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) é o primeiro grupo na Amazônia
com foco em pesquisas sobre actinobactérias. Consideradas bactérias “do bem”,
por serem não patogênicas, as actinobactérias produzem uma infinidade de
moléculas bioativas com propriedades terapêuticas, como antibióticos,
antiparasitários, antitumorais, anti-inflamatórios, antivirais, além de
vitaminas e enzimas. O propósito dos pesquisadores é, através do isolamento
desses microrganismos com potencial biotecnológico, identificar substâncias
benéficas de amplo uso medicinal e industrial e, posteriormente, investir na
produção de fármacos.
Os experimentos da equipe têm
início com uma amostra ambiental proveniente de solos, sedimentos de rios ou
partes de plantas, por exemplo. "Pouco sabemos sobre a distribuição das
actinobactérias na Amazônia, um bioma que possui diferentes características de
solos e vegetação e que possivelmente detém inúmeras actinobactérias produtoras
de bioativos diferenciados. Me sinto privilegiada em morar na Amazônia, cenário
natural para a descoberta de novos microrganismos e suas moléculas. Estamos
falando de bactérias que nunca foram descritas na literatura científica",
enfatiza.
Segundo a bióloga, as pesquisas
para obtenção de bioativos de origem microbiana iniciaram-se na década de 1930,
sendo as actinobactérias um dos grupos mais pesquisados. "São mais de 130
gêneros no grupo das actinobactérias já identificados pela ciência",
afirma. Um dos principais gêneros é o Streptomyces, responsável por cerca de
70% dos antibióticos fabricados hoje pela indústria farmacêutica.
Actinobactérias em rochas –
Katrine recebeu das mãos do geólogo Anderson Mendes, da Universidade Federal do
Pará (UFPA), uma rocha coletada na região do município de Monte Alegre, datada
com mais de 300 milhões de anos. A pesquisadora passou a observar a incidência
microbiana na amostra, composta por 12 camadas de rocha entremeadas por faixas
de argila.
Inicialmente, a rocha não se
mostrava um ambiente interessante para os microrganismos, por não ofertar
nutrientes para sua proliferação. A expectativa era encontrar actinobactérias
na argila, já que, por sua composição orgânica, esse seria um ambiente
naturalmente mais propício. “Foi impressionante verificar a incidência de
actinobactérias justamente na rocha, cuja composição foi identificada na
caracterização físico-química. Era basicamente calcário, um dos nutrientes mais
comuns para esse tipo de bactérias”, explica.
Nesse momento, a equipe do
laboratório está focada em traçar o perfil bioquímico das 21 cepas de
Streptomyces sp. isoladas da rocha. “Estamos observando a produção de enzimas
de aplicação terapêutica com ação antitumoral, como a L-Glutaminase e a
L-Asparaginase, utilizadas atualmente no tratamento da leucemia linfoide aguda,
e também substâncias antibióticas que possam combater microrganismos multirresistentes”,
ressalta a professora.
Segundo Katrine, enzimas desse
tipo já são comercializadas, mas as que se encontram no mercado são extraídas
de fungos e as enzimas identificadas na rocha amazônica devem apresentar um
metabolismo diferenciado, devido às condições em que proliferaram. “Por serem
nativas da Amazônia, de uma rocha datada com mais de 300 milhões de anos,
possivelmente essas enzimas e esses antibióticos são bastante diferentes dos
que já são produzidos”, avalia.
Os estudos desenvolvidos no Laboratório
de Microbiologia do Instituto de Saúde Coletiva (Isco) levam à elucidação da
molécula, apresentando sua estrutura tridimensional. Esse trabalho é
desenvolvido concomitantemente aos ensaios biológicos que permitem saber qual
propriedade terapêutica a bactéria apresentará e sua possível aplicação,
seguindo o rigor da indústria farmacêutica. O próximo passo é requerer o pedido
de patente da molécula identificada, vislumbrando a posterior produção do
fármaco.