Ela é uma das melhores partes do
inverno amazônico. Salgada, doce ou acompanhada de café fresquinho, saborear
uma pupunha (bactris gasipaes Kunth) é um dos prazeres mais paraenses.
Preocupados em divulgar e aproveitar este fruto, que é abundante em partes do
Pará, pesquisadores da Universidade do Estado do Pará (Uepa) desenvolvem
trabalhos em uma conserva de pupunha e ainda uma farinha sem glúten e altamente
nutritiva empregada na composição de uma mistura pronta para bolo. Riquíssima
em vitamina A e acido oleico – o mesmo que dá ao óleo de coco seu status de
superalimento -, ela pode ser mais uma solução regional para as necessidades nutricionais
da população local.
Todo paraense sabe que a pupunha
“da boa” aparece alguns meses depois do início do período chuvoso. A abundância
na oferta vai lentamente derrubando os preços e os meses de fevereiro a maio
são de festa para que aprecia o fruto. Porém, junto com as chuvas, a pupunha se
vai. Mas e se, ao invés de ter que esperar o inverno amazônico, a gente pudesse
consumir pupunha de qualidade o ano inteiro? Essa foi a proposta que moveu as
Tecnólogas em Alimentos Simone Santos e Bianca Pinheiro a buscar um produto
inédito no mundo: a pupunha em conserva. Os resultados obtidos no Trabalho de
Conclusão de Curso (TCC) foram animadores, apesar de a dupla não ter conseguido
chegar a uma fórmula que confira um alto prazo de validade ao produto.
“A pupunha é um fruto muito
surpreendente e único. É muito consumida e pouco explorada. Há pouquíssima
literatura acerca dele e isso dificultou o desenvolvimento do produto, pois o
tempo de pesquisa para o TCC é curto. Então, queremos com nosso trabalho também
expandir a quantidade de informações disponíveis sobre este fruto”, explicou
Simone. As duas já desenvolvem o projeto para seguir a pesquisa no mestrado.
Para a orientadora da pesquisa, a
professora doutora em Ciência e Tecnologia de Alimentos, Ana Carla Pelaes, os
pesquisadores locais têm a responsabilidade de desenvolver literatura
científica sobre os produtos regionais. “Por isso é uma postura do curso de
Tecnologia de Alimentos incentivar pesquisas sobre estes ingredientes. Isso
pode ajudar a levar estes produtos para o resto do país e do mundo”, observou.
A fase sensorial – a degustação do produto por voluntários – teve um ótimo
retorno e demonstrou que não há diferenças significativas entre o sabor do
fruto em conserva e daquele que acabou de ser cozido.
Durante a pesquisa, Bianca se
disse surpresa com a qualidade nutricional da pupunha. “Ela é rica em acido
oleico, que é uma gordura boa, e também em minerais como Cálcio e Fósforo.
Infelizmente a fibra está mais localizada na casca, mas o fruto é excelente
fonte de carboidratos”, pontuou. O trabalho confirmou ainda o que o saber
popular já anunciava: a pupunha tem abundancia de vitamina A. Quanto mais
vermelha a casca – e a polpa – maior a concentração de carotenoides. Esse combo
de vitaminas e aminoácidos auxilia no fortalecimento do sistema imunológico,
diminui o risco de doenças degenerativas como as cardiovasculares, previne a
degeneração macular e formação de catarata.
Na variedade Vaupés, aquela que
chega a apresentar gordura em volta do carço, há cerca de 260 calorias em cada
100 gramas do fruto, o que a torna uma ótima fonte de energia e ainda um
inimigo das dietas de perda de peso. Explorar todo esse potencial nutritivo
para pessoas com certas restrições alimentares foi o objetivo da pesquisa das
tecnólogas em alimentos, Adrianne Brito e Bianca Negrão. Elas desenvolveram uma
mistura para bolo feita com farinha de pupunha em substituição à farinha de
trigo. 100% livre de glúten, o produto pode ser mais uma opção no crescente
mercado voltado para os celíacos.
“Essa pesquisa é muito
importante, especialmente para as pessoas que precisam de produtos sem glúten.
Contudo, continuar essa pesquisa não é fácil, pois precisaríamos de apoio
financeiro. No momento, estamos fazendo mestrado, pesquisando outros produtos,
mas pensamos em patentear o pré-mix para bolo com farinha de pupunha, pois
acreditamos no potencial industrial que ele tem”, revelou Adrianne. As
professoras doutoras Suezilde Amaral e Rafaella Mattieto orientaram o processo
de criação da farinha e da mistura.
O pré-mix apresentou valores
nutricionais dentro dos padrões exigidos pela indústria alimentar. “O fruto da
pupunheira é altamente nutritivo, tem um teor elevado de vitamina A, como
também outras funções biológicas. Além disso, é um fruto regional, de sabor
agradável e faz parte dos hábitos alimentares da nossa região", ressaltou
Bianca Pinheiro.
Segundo ela, a farinha de
pupunha, como protagonista das matérias primas usadas, agregou sabor ao produto
final. Com isso, o principal objetivo foi atingido, pois a substituição do
glúten em produtos de panificação é um grande desafio. A qualidade e
estabilidade da farinha obtida da pupunha foi uma surpresa para as
pesquisadoras.
O produto foi muito bem avaliado
pelos degustadores, que foram fundamentais para a fórmula do produto final.
“Disponibilizamos aos provadores 12 formulações, às quais eles deram notas
quanto a certos atributos. E, a partir das respostas deles, chegamos à
formulação final. Vale ressaltar que, ao compararmos nosso produto com outros
trabalhos científicos, observamos que tivemos resultados melhores no que se
refere à opinião dos provadores”, disse Adrianne. Elas esperam apoio de
parceiros na indústria para que o produto possa ser disponibilizado em escala
comercial.