O Ministério Público Federal (MPF)
encaminhou à Justiça parecer em que se manifesta pela rejeição liminar
(urgente) de queixa-crime ajuizada pela mineradora Hydro Alunorte contra um
pesquisador do Instituto Evandro Chagas (IEC), órgão vinculado à Secretaria de
Vigilância em Saúde (SVS) do Ministério da Saúde, por suposta prática dos
crimes de calúnia e difamação contra a empresa.
Para o procurador regional da República
José Augusto Torres Potiguar, autor do parecer, não há justa causa nem
tipificação para as acusações da empresa.
A manifestação foi encaminhada pelo MPF
à Justiça Federal em Belém (PA) na última quinta-feira (7).
Entenda o caso – Em fevereiro de 2018, o
acusado pela Hydro, Marcelo de Oliveira Lima, foi o coordenador da equipe
designada pelo IEC – a pedido do MPF e do Ministério Público do Estado do Pará
(MPPA) – para efetuar a avaliação dos danos ambientes e riscos à saúde humana
decorrentes do vazamento de efluentes oriundos da planta industrial da empresa
em Barcarena.
Quase um ano depois, em janeiro deste
ano, a mineradora ajuizou ação penal contra o pesquisador, alegando que houve
crime contra a honra da empresa por causa das manifestações de Lima sobre os
resultados das pesquisas.
Segundo a Hydro, os crimes foram
agravados pelo fato de o pesquisador ter feito essas manifestações – que a
empresa considera serem ofensas – em entrevistas à imprensa, o que aumentaria o
potencial de propagação das informações divulgadas.
A empresa alega que Marcelo de Oliveira
Lima expôs suas opiniões pessoais sobre o evento investigado, deixando de
obedecer, segundo a empresa, a isenção exigida do cargo ocupado pelo pesquisador.
Liberdade científica – “O que se tem, no
presente caso, é a expressão do convencimento técnico-científico de um
profissional, o qual agiu dentro de sua esfera interpretativa, a partir da
análise dos elementos técnicos com que teve contato na ocorrência”, defende
Potiguar na manifestação.
Segundo o procurador regional da
República, “trata-se, isto sim, do exercício de liberdade científica, cujo
respeito é absolutamente necessário para o avanço da ciência e da própria
democracia”.
“Com efeito, a partir do momento em que
os pesquisadores tiverem receio de emitir e publicizar suas impressões e
interpretações objetivamente alcançadas, o progresso científico estará
seriamente ameaçado”, alertou.
“A ciência não é unívoca, comportando interpretações
distintas e até mesmo contrastantes sobre os mesmos fenômenos; não há
hierarquização e valoração entre análises científicas: o que existe são
métodos, técnicas, escolas e instrumentos científicos diferentes, os quais
permitem alcançar impressões também distintas. A ciência também é, pois, um
campo para o exercício da tolerância e discordância. Mais uma vez, tolher uma
convicção científica em virtude de existirem manifestações distintas da
alcançada pelo pesquisador representaria grave atentado à sua liberdade e,
inclusive, colocaria em risco valores caros à toda a sociedade, que é
destinatária final dos saberes e conquistas científicas”, destacou o membro do
MPF.
Processo 0001237-77.2019.4.01.3900 – 3ª
Vara da Justiça Federal em Belém (PA)