Poró Borari, preso ao se manifestar por saúde em Santarém. Foto: Marquinho Mota/FAOR
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Atendendo a pedido do Ministério
Público Federal (MPF) e da Defensoria Pública da União (DPU), a Justiça Federal
de Santarém libertou o índio Poró Borari, que havia sido preso em
flagrante pela Polícia Federal nesta terça-feira, acusado de manter em cárcere privado
funcionários da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai). A prisão
aconteceu durante uma manifestação de índios de 13 etnias da região do baixo
Tapajós e Arapiuns, que ocuparam a secretaria em protesto pelo direito à
assistência de saúde, atualmente negado para esses povos.
Após a ocupação da Sesai pelos
índios, agentes do departamento da Polícia Federal em Santarém chegaram ao
local e acusaram Adenilson Alves, o Poró Borari, de ser líder do movimento.
Também o acusaram de ser responsável pelo cárcere dos trabalhadores da Sesai,
apesar da secretaria estar funcionando normalmente, com os servidores
trabalhando e de portas abertas. Mesmo assim, Poró Borari foi levado para o
presídio e celulares de dois manifestantes que filmavam a ação da PF foram
apreendidos sem ordem judicial.
“A acusação que pesa sobre o
indiciado não encontra respaldo fático. Adenilson Alves não se afigura líder de
qualquer ato ilegal. Não houve qualquer comando expresso de proibição de livre
circulação de pessoas, sejam elas usuárias, servidoras ou prestadores de
serviço no órgão”, dizem a defensora pública da União Ingrid Soares Leda
Noronha e o procurador da República Camões Boaventura no pedido de liberdade em
favor de Poró Borari.
Para MPF e DPU, “um fato é
inequívoco: a prisão e a abordagem da Polícia Federal foi de todo ilegal.
Partiu-se de ilações desacompanhadas de realidade”. “O ato policial merece reprimendas”, diz o
pedido de liberdade. A defensora pública e o procurador acompanharam a autuação
do indígena dentro da delegacia da Polícia Federal e relataram à Justiça que,
durante o interrogatório, a autoridade policial fez perguntas tendenciosas e
manifestações jocosas.
Boaventura e Noronha ressaltaram
ainda que Poró Borari não tem passagem pela polícia, é estudante da
Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) e pai de duas crianças, que dele
dependem financeira e emocionalmente.
A manifestação
A reivindicação dos índios na
Sesai, para o MPF e a DPU, é legítima e mais do que respaldo legal, tem
respaldo judicial. A assistência diferenciada à saúde indígena é um direito e a
Sesai tem negado esse direito às etnias Borari, Arapyun, Maytapu, Cara-Preta,
Jaraqui, Tapajó, Kumaruara, Tupinambá, Apiaká, Munduruku, Tupaiú, Arara Vermelha,
Tapuia que moram no baixo Tapajós e Arapiuns. A justificativa da Sesai é que
são índios que não moram em terras indígenas.
A justificativa não tem
fundamento nenhum no ordenamento jurídico brasileiro e a própria Justiça
Federal de Santarém reconhece isso. Em janeiro desse ano, a pedido do MPF, a
Justiça obrigou, no processo nº 2096-29.2015.4.01.3902, que a Sesai passasse a
ofertar o atendimento diferenciado. Quase oito meses depois, a Sesai não
cumpriu a ordem judicial, o que deu origem à manifestação.
Multa
Logo após a libertação de Poró
Borari, o MPF pediu à Justiça que execute multa contra a Sesai por descumprir a
ordem judicial para oferecer assistência às 13 etnias. A multa de 1 milhão e
970 mil reais corresponde aos 197 dias em que a decisão está sendo desobedecida
pela Sesai. A Justiça havia arbitrado em R$ 10 mil a multa por dia de
desobediência.
Ontem, após a manifestação dos
índios, a Sesai comprometeu-se a criar um grupo de trabalho para debater o
atendimento de saúde das etnias, o que, para o MPF, não é suficiente. A ordem
judicial de janeiro de 2016 determinava um prazo de 90 dias para que fossem
cadastrados todos os índigenas das 13 etnias da região, 48 horas para que a
Casa de Saúde do Índio de Santarém passasse a atender todo e qualquer indígena
que lhe procurasse, independente do local de moradia e também 90 dias para
organizar equipes multidisciplinares para atender os indígenas. Nenhuma das
medidas foi cumprida até hoje.