Por meio de sensoriamento remoto,
os resultados mostraram que as ações antrópicas provocaram aquecimento das
camadas sobrejacentes à superfície terrestre, aumento de calor, temperatura e
diminuição da umidade do ar.
O impacto das ações humanas sobre
as propriedades termodinâmicas da atmosfera no mosaico de florestas e unidades
de conservação existentes ao longo da região de influência da BR-163, rodovia
aberta em 1973, durante o governo militar, e que liga o norte do estado do Mato
Grosso à região Oeste do Pará, foi tema de pesquisa da tese de doutorado do
Prof. Wilderclay Machado, orientada pelo Prof. Rodrigo Silva no Programa de
Pós-Graduação em Sociedade, Natureza e Desenvolvimento (PPGSND) da Ufopa.
De acordo com o professor
Wilderclay, estudos apontam que em 2001 a área florestal original, de
aproximadamente 6,2 milhões de km², havia sido reduzida para 5,4 milhões de
km², 87% da área original. Recentemente, o desmatamento na Amazônia Legal
aumentou em 24%, de agosto de 2014 a julho de 2015, em relação ao período
anterior, de agosto de 2013 a julho de 2014. Os atores sociais responsáveis
pela alteração da paisagem e pela redução da cobertura vegetal neste
ecossistema são vários, e foi a ação deles na região que motivou a pesquisa em
física focada no meio ambiente. "Isso ocorre por diversos fatores, seja
pela construção de hidrelétricas, áreas de pastagem, agricultura, urbanização,
mas principalmente a atividade agropecuária, pois estes atores são responsáveis
por 90% do desmatamento da região", ressalta.
Essa preocupação ambiental, que
começou na iniciação científica em 2001 e perdurou até o doutorado, em 2016,
motivou a identificar o grau de reversibilidade do impacto da construção da
BR-163. Assim, por meio do algoritmo SEBAL, um sistema de equações para cálculo
de energia superficial e que precisa de dados/imagens de satélite e informações
de superfície, como temperatura, umidade relativa do ar e velocidade do vento,
o pesquisador investigou as consequências da redução da floresta no entorno da
BR-167.
"Foi observando fenômenos
socioambientais como a alteração da paisagem e a redução da cobertura vegetal,
motivados pelo fator econômico – este que cada vez mais vai adentrando as áreas
de floresta, mudando as condições da superfície em uma escala gigantesca,
principalmente ao longo da BR-163 –, que definimos como condições antrópicas e
como isso vem afetando algumas propriedades termodinâmicas da atmosfera",
comenta.
Para entender como tudo isso tem
afetado essas propriedades, o Prof. Wilderclay saiu dos laboratórios de
aplicação das teorias da física e da termodinâmica e foi aplicá-las a céu
aberto. Ele calculou o fluxo de energia e o quanto de evapotranspiração é
transmitido para a atmosfera na área de influencia da BR-163, que corresponde a
330 mil km², que vai de Santarém até o sul do Pará, no município de Novo
Progresso. Essas variáveis são importantes indicadores de degradação ambiental.
Resultados
De acordo com os resultados
encontrados pelo professor, mesmo sendo pequenas as áreas de ação antrópica
percebidas após a construção da BR-163, elas influenciam de forma significativa
a refletividade de radiação solar de onda curta, ou seja, aquela luz visível
para a atmosfera, e que é a fonte primária de energia. "Com relação ao
calor, também houve uma perda de energia da superfície para a atmosfera,
aquecendo as camadas sobrejacentes à superfície; em termos de fluxo de calor
sensível, houve um aumento significativo também, ou seja, as ações antrópicas a
nível regional contribuíram com um maior aumento de calor, o que dá aquela
sensação de a temperatura estar mais elevada, mas a própria temperatura também
aumentou", constatou.
Unidades de conservação
Como também foram analisadas as
influências das unidades de conservação na manutenção das condições socioambientais
das populações locais, a pesquisa evidenciou a importância da floresta para o
equilíbrio do ecossistema, compensando o impacto dos efeitos de degradação.
"As florestas mantêm um padrão adequado para o equilíbrio da distribuição
da umidade para o continente. Ou seja, verificou-se que as áreas de florestas
possuem todas as componentes do balanço de energia para se manter o equilíbrio
da manutenção do clima, mesmo com as ações antrópicas ainda existentes
nelas", pondera.
Outro fator observado é que as
florestas lançam uma bomba de massa de água para a atmosfera. "Do ponto de
vista termodinâmico da atmosfera, devido às suas propriedades, é dessa forma
que elas conseguem manter esse equilíbrio", conta.
Com a constatação dos impactos da
degradação ambiental em torno da rodovia, o próximo desafio de pesquisa é
construir cenários para a região. "Agora é preciso responder a tais
questões: até que ponto, sob a ótica da evapotranspiração e das componentes do
balanço de energia, a fragmentação de recursos florestais pode ocorrer sem
haver um impacto ambiental irreversível?
Ou seja, qual o limite de desmatamento que os recursos florestais
conseguem suportar?", disse.
Na avaliação do Prof. Rodrigo
Silva, orientador da pesquisa e membro do Grupo de Pesquisa Biogeofísica da
Região Amazônica e Modelagem Ambiental (BRAMA), a temática do impacto das
mudanças do uso da terra na região amazônica é destaque atual na comunidade
científica mundial. "Neste trabalho foi investigado como a presença da
BR-163 promove alterações nos mecanismos que controlam o aquecimento do ar e a
evapotranspiração na região Oeste do Pará. Já para o programa de doutorado
PPGSND, toda e qualquer tese que concluímos é fato para celebração e o devido
reconhecimento, principalmente pela comunidade acadêmica da Ufopa",
conclui.
Sobre o BRAMA
O grupo de pesquisa realiza
estudos que caracterizam os processos físicos, químicos e biológicos que
ocorrem na interação entre a biosfera e a atmosfera, descrevendo os fatores que
controlam as trocas de energia e massa (H2O, CO2, CH4, N2O) nos diferentes ecossistemas
amazônicos. São estudos de bases teóricas e experimentais sobre a estrutura e
funcionamento dos ecossistemas terrestres e aquáticos da Amazônia, avaliando
sua distribuição espacial e suas relações com os fatores ambientais e
climáticos da região, em condições naturais e alteradas pela ação humana. São
enfatizadas as interações entre as florestas, solos, rios e lagos da região com
a atmosfera terrestre na região do Oeste do Pará.