Um novo estudo publicado por cientistas
ligados ao IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) mostra como as
antas são importantes para a regeneração de florestas degradadas na Amazônia. O
maior herbívoro da América do Sul anda muito, come muito – e faz muito cocô,
especialmente nas áreas com vegetação menos densa.
Foi o que os pesquisadores viram na
Fazenda Tanguro, em Mato Grosso, na transição entre Amazônia e Cerrado, onde
coletaram amostras de cocô, além de vídeos dos animais: quase 130 mil sementes
retiradas de 163 amostras espalhadas em 150 hectares foram catalogadas em 24
espécies. Mas a principal contribuição das antas na regeneração, além de seu
apetite voraz e do cardápio diversificado, foi a preferência por florestas
degradadas para depositar as fezes.
Numa floresta com queimadas anuais, os
cientistas estimaram 11.057 sementes por hectare/ano, enquanto na área com
queimadas a cada três anos a relação era de 8.587 sementes por ha/ano e, na
floresta intocada, de somente 2.950 sementes por ha/ano.
O grupo defende a hipótese que as antas
usam mais as florestas degradadas devido à presença de plantas com folhas mais
palatáveis. “Mas, quando se trata de frutos consumidos, que é o que interessa
para dispersão de sementes, vimos que elas dispersam mais as espécies de
estágios tardios da sucessão. Resumindo, elas têm um papel importante tanto na
dispersão de espécies iniciais quanto tardias, contribuindo para o processo de
regeneração como um todo”, explica o ecólogo Lucas Paolucci, principal autor do
artigo científico publicado pela revista Biotropica.
O papel das antas como dispersoras de
sementes fora medido previamente em outras regiões, como na mata atlântica, mas
nunca numa área degradada. “Muitos animais cumprem esse papel, e por isso é
importante protegê-los e permitir seu trânsito”, diz Paolucci. “Os macacos
dispersam até mais espécies e em maior quantidade. Mas as antas conseguem
dispersar sementes maiores e em florestas degradadas, além de passar por áreas
com pasto e plantações, o que os macacos não fazem. Isso permite o fluxo de
espécies entre florestas fragmentadas.”
Apetite
As antas podem chegar a 300 quilos e são
os últimos representantes da megafauna na Amazônia, grupo de grandes animais
cuja maioria foi extinta no fim do Pleistoceno (época geológica que se estendeu
de 1,8 milhão a 11 mil anos atrás), como o mamute e a preguiça-gigante.
Além de um apetite voraz, a boca
avantajada também permite dispersar sementes maiores do que outros animais –
ainda que, na coleta feita em Mato Grosso, elas tenham demonstrado especial
apreço pela Bellucia grossularioides, conhecida como goiaba-de-anta, cujas
sementes têm meio centímetro, ou menos.
A B. grossularioides é uma árvore
pequena, porém de clímax, quando a floresta atinge seu estágio mais maduro,
assim como o jatobá (Hymenaea courbaril), a mamorana-de-terra-firme (Eritheca
globosa), a murici-da-mata (Bysonima crispa), a fava-orelha (Enterolobium
schomburgkii), além de outras espécies encontradas nas fezes das antas.
Quatro das espécies catalogadas pelos
cientistas não foram encontradas nos 150 hectares onde trabalharam, o que mostra
outra característica das antas: sua imensa capacidade de deslocamento. As antas
se movimentam até 20 quilômetros em linha reta, e ocupam uma área grande, entre
220 a 470 hectare. “Independentemente de onde vieram, essas sementes contribuem
para o aumento da diversidade das áreas degradadas”, diz Paolucci.