Criança Munduruku. Foto: Ascom/MPF-PA |
O Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente (Ibama) arquivou o processo de licenciamento ambiental da usina São
Luiz do Tapajós, conforme recomendado pelo Ministério Público Federal (MPF) e
seguindo pareceres da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do próprio Ibama. O
arquivamento se dá por razões legais – a usina alagaria território indígena
Munduruku e obrigaria remoção de aldeias, o que é proibido pela Constituição,
mas também por falhas nos estudos de impacto ambiental.
“Determino o arquivamento do
processo nº 02001.003643/2009-77. O projeto apresentado e seu respectivo Estudo
de Impacto Ambiental – EIA não possuem o conteúdo necessário para análise de
viabilidade socioambiental, tendo sido extrapolado o prazo previsto na
resolução Conama 237/1997, para apresentação das complementações exigidas pelo
Ibama”, diz a presidente do Ibama, Suely Mara Araújo, em despacho enviado à
Diretoria de Licenciamento do órgão para que tome providências para o
encerramento do processo.
“Cabe destacar que a Funai aponta
óbices legais e constitucionais ao licenciamento ambiental do empreendimento,
em razão do componente indígena, óbice esse corroborado pela Procuradoria
Federal Especializada junto ao Ibama”, diz ainda o documento. Agora, o conteúdo
do despacho da presidência do Ibama será comunicado ao interessado – no caso as
Centrais Elétricas do Brasil (Eletrobras), com abertura de prazo para recurso.
A Eletrobras, responsável pelo
empreendimento, não cumpriu a obrigação de corrigir uma série de lacunas graves
nos estudos e o Ibama entendeu que não existe mais prazo para que os problemas
sejam resolvidos. Em parecer enviado ao gabinete da presidência do Ibama, a
Diretora de Licenciamento do órgão, Rose Mirian Hofmann, apontou que além da inconstitucionalidade
prevista pela Funai e reforçada pelo MPF, havia razões suficientes também do
ponto de vista ambiental para o arquivamento do processo. Em 2014, o Ibama
pediu estudos da Eletrobras para uma lista extensa de possíveis impactos que
haviam sido negligenciados. O prazo, aponta Hofmann em seu parecer, era de
quatro meses e até a suspensão do licenciamento em abril de 2016, nada havia
sido respondido. Também não houve pedido de prorrogação.
As omissões nos estudos de
impacto ambiental incluem a ausência de avaliação sobre assoreamento dos corpos
d'água tributários do Tapajós, o impacto sobre os lençóis freáticos e até sobre
a ictiofauna, uma das questões mais sensíveis para a região já que os moradores
estão entre os maiores consumidores do mundo de pescado. “A ausência de algumas
dessas informações no EIA salta aos olhos, por serem impactos notórios da
tipologia de geração hidroelétrica, que precisam ser avaliados antes da decisão
sobre a viabilidade do empreendimento”, destacou o parecer da diretora de
licenciamento.
Festa
Crianças Munduruku brincam no rio Tapajós - Foto Greenpeace |
“Nós, Munduruku, estamos muito felizes com o cancelamento da usina. Isso é muito importante para o nosso povo. Agora vamos continuar lutando contra as outras usinas no nosso rio”, afirma Arnaldo Kabá Munduruku, cacique-geral do povo. Ainda existem outros 42 projetos de hidrelétricas apenas na bacia do rio Tapajós e dezenas na Amazônia. Recentemente, mais de 1,2 milhão de pessoas ao redor do mundo se juntaram à luta dos Munduruku contra as hidrelétricas.
Além de alagar a terra indígena Sawré Muybu, do povo Munduruku, e impactar dezenas de comunidades ribeirinhas, a obra causaria impactos ambientais irreversíveis. No ano passado, uma análise do Estudo de Impacto Ambiental da hidrelétrica, produzida pelo Greenpeace e realizada por pesquisadores renomados, já havia mostrado a inviabilidade do empreendimento. "Além de uma grande vitória das populações tradicionais e indígenas do Tapajós, a decisão de cancelar o processo de licenciamento desta usina também reforça a necessidade do Brasil reavaliar sua política de expansão da matriz de hidrelétricas na Amazônia, devido aos impactos inaceitáveis que este tipo de obra gera sobre o bioma", afirma Danicley de Aguiar, da campanha da Amazônia do Greenpeace.