Que o vinho é bom para o paladar
e para a saúde, ninguém nega. É possível listar diversas razões pelas quais a
bebida deveria fazer parte do dia a dia, seja para acompanhar uma refeição,
seja para promover mais qualidade de vida. Contudo, nem todos os adjetivos
associados ao vinho têm sido capazes de estimular um aumento de consumo no
Brasil: nos últimos 10 anos o consumo per capta passou dos módicos 1,8
litros/ano para os atuais, e igualmente pífios, 2 litros. Mais do que os
desafios culturais, o setor sofre com a constante alta de impostos – o último,
há cerca de um ano, mudou a forma de tributação e tornou rótulos já caros,
ainda mais custosos. Num país onde o preço está equivocadamente associado à
qualidade do vinho, a alta carga tributária é, indiscutivelmente, um dos
maiores entraves para a popularização da bebida e expansão do consumo
qualificado.
Impostos em alta – consumo em
baixa
O consumo brasileiro se torna
ainda mais modesto se comparado com países vizinhos: chilenos e argentinos
consomem anualmente de 8 a 10 vezes mais litros da bebida. Esses fatores não
estão ligados exclusivamente às preferências do consumidor nacional: países
asiáticos com pouca tradição no consumo e na cultura do vinho já apresentam
números mais expressivos do que o Brasil, que possui uma indústria sólida e
regiões como a Serra Gaúcha, de grande tradição vinícola.
Um dos maiores responsáveis por
essa morosidade é a alta carga de impostos: no mercado brasileiro a composição
do preço final do vinho é, em maior parte, formada por tributos. A mudança mais
recente, proposta pela da Medida Provisória 690/2015 e transformada na Lei nº
13.241/2015 alterou o antigo modelo de alíquota de IPI que variada de R$
0,73/litro para rótulos nacionais até US$ 70 para os importados. No novo
modelo, em vigor desde dezembro de 2015, o IPI (Imposto sobre Produtos
Industrializados) incidente sobre a bebida passou a ser de 10% em relação ao preço
do vinho.
E não para por aí: antes de
chegar à mesa do brasileiro, diversas cifras são adicionadas ao custo final de
uma garrafa e, quanto mais longo o caminho até o consumidor final, maior será a
fatia direcionada ao governo. Números do Instituto Brasileiro de Planejamento e
Tributação (IBPT) apontam que somando ICMS, IPI, COFINS, PIS e ainda encargos
relacionados à cadeia produtiva, 54.73% do preço do vinho nacional correspondem
a impostos. Porém, se essa garrafa vem de outro país a proporção é ainda maior:
até 74.73% do custo final de um vinho importado corresponde a tributos.
Entraves burocráticos
Tratando-se de rótulos
estrangeiros, existem ainda dois itens que podem tornar o preço final ainda
mais salgado: a complexidade e a demora do processo de importação. Para se ter
uma ideia, antes de chegar às prateleiras, o importador deve considerar os
custos de frete, armazenamento adequado e de liberação do produto na alfândega,
o chamado desembaraço aduaneiro. Além disso, cada garrafa deve atender aos padrões
de rotulagem nacionais e passar por uma análise química a cargo do Ministério
da Agricultura, processo este que requer a retenção de algumas amostras de cada
lote. Lembrando que boa parte desses processos estendem-se por longos períodos,
aumentando os custos de importação. Ou seja, o produto já atraca no país com um
custo elevado, antes mesmo de passar pelos encargos de comercialização.
Consumo qualificado
Não é a toa que o consumo
brasileiro é composto, em geral, por vinhos de baixa qualidade, de acordo com
dados do site especializado Ibravin, considerando-se apenas o consumo de vinho
fino, a média per capta cai para apenas 0,7 litros/ano. De acordo com Stephanie
Duchene, sommèliere que trabalha com rótulos artesanais importados da França, é
essencial reorganizar o setor, mas também é importante estimular o consumo
qualificado: “Não estamos falando apenas de quantidade, mas principalmente de
qualidade. O consumidor brasileiro muitas vezes não se sente a vontade para se
aventurar no mundo dos vinhos em virtude do pouco conhecimento. Porém, se
estimularmos um consumo qualificado, no qual ele não precisa beber muito, mas
sim conhecer vinhos de qualidade; permitindo que ele se identifique com a
bebida que aprecia, certamente o vinho estará presente com mais frequência na
sua mesa.” Para a fundadora da Wine Exclusive, é preciso que esse hábito faça
parte do dia a dia do brasileiro “não apenas para aumentar a proporção de
consumo anual, mas principalmente para que o consumidor tenha contato com bons
vinhos. Quando falamos em consumo qualificado não estamos falando em beber
muito, mas conhecer vinhos que realmente traduzam essa cultura tão rica.”. –
conclui.
Vinho como alimento
Uma das saídas para estimular o
consumo e, ao mesmo tempo, baixar os encargos seria alterar a classificação da
bebida no país. Atualmente, o vinho entra na mesma classificação de bebidas
alcoólicas ou de artigos de luxo, produtos que, devido sua natureza, sofrem
sobretaxação. Contudo, a exemplo, países como Estados Unidos, Chile e França já
categorizam a bebida como um alimento funcional em virtude dos benefícios que o
consumo moderado pode trazer à saúde. No Brasil, tramita na Câmara dos
Deputados desde 2013 o Projeto de Lei 5965/13, de autoria do deputado Edinho
Bez (PMDB/SC), que propõe a inclusão do vinho na cesta básica e sua
classificação como alimento, dessa forma seria possível reduzir impostos e
estimular a produção nacional. Atualmente, o projeto aguarda apreciação da
Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural
(CAPADR).
Contudo, enquanto mudanças como
essa não vem, é preciso investir em conhecimento e apostar no consumo
qualificado, principalmente na hora de escolher um rótulo estrangeiro. De
acordo com Geoffrey Pompier, empreendedor do setor, neste caso, o consumidor
deve optar por rótulos sem intermediários “Quanto menos intermediários houver
entre o produtor e o consumidor, mais acessível será o preço da garrafa. Por
isso, nem sempre comprar uma garrafa num supermercado é a opção mais barata. Além
disso, a compra em locais especializados pode garantir mais qualidade em
virtude da exclusividade do produto.”- conclui.
Fonte: Wine Exclusive