O dia 15 de agosto é feriado, mas você
sabe por quê? A data é dedicada à Adesão do Pará à Independência do Brasil,
ocorrida em 1823, um ano depois da Independência do Brasil. Para a professora
da Faculdade de História da Universidade Federal do Pará (UFPA), Magda Ricci, a
adesão do Pará é o momento histórico no qual se desenvolve uma identidade
brasileira entre o povo paraense, que até então tinha muito mais vínculos com
os portugueses do que com o resto do Brasil.
“É um momento especial de formação de
uma identidade local. O que nasceu mais rápido foi um sentimento de
pertencimento ao Pará. A adesão do Pará e a dos paraenses à causa brasileira em
15 de agosto de 1823 foi o primeiro passo para a formação de uma identidade
patriótica maior, porém este processo identitário foi longo e cheio de
reveses”, explica a historiadora.
O processo de adesão - O Grão-Pará foi a
última Província a aderir à Independência, entretanto foi o primeiro a apoiar
os portugueses na revolução liberal de 1820. A pesquisadora da UFPA explica que
isso aconteceu por causa da forte ligação da província com comerciantes de
Portugal. “Belém, por exemplo, tinha o mesmo status que esta cidade lusitana do
Porto e o bispado daqui esteve até 1826 institucionalmente atrelado ao
Patriarcado de Lisboa, o que fortalecia os laços entre paraenses e portugueses.
Também a distância e a navegação (a época feita por velas e dependente dos
ventos) era bem mais segura e rápida para Lisboa do que para o Rio de Janeiro,
o que facilitava o comércio e as relações sociais e políticas com Portugal.”
Entretanto, após a Independência do
Brasil em 7 de setembro de 1822, a relação da província com as Cortes de Lisboa
ficou estremecida. “As Cortes de Lisboa foram se radicalizando e se tornando
menos propícias a ouvirem deputados de fora de Portugal, mesmo assim os três
deputados do Pará e do Rio Negro estavam entre os poucos brasileiros que
ficaram até o final das Cortes e assinaram a constituição portuguesa”, detalha
a professora.
Outro fato que colaborou para a
assinatura do termo de adesão do estado à Independência foi o blefe realizado
por uma frota de militares enviada por D Pedro I com o intuito de unir o país e
incentivar a adesão à causa da independência. Os militares afirmavam que eram o
primeiro de uma frota de navios que invadiria o estado caso os paraenses não
aceitassem pacificamente se tornar brasileiros. Entretanto tudo não passava de
um golpe e quando as elites locais perceberam, já era tarde demais e já estavam
politicamente obrigadas a assinar o documento de adesão.
“Contudo esta tomada não mudou muita
coisa na vida dos paraenses, especialmente na vida dos mais pobres e dos
escravos, dos povos indígenas e dos mestiços. Deixamos de pertencer ao império
português com sede em Lisboa e passamos a pertencer ao império brasileiro com
sua Corte no Rio de Janeiro. Havia uma expectativa de mudanças, especialmente
entre os paraenses natos. Contudo nada disso ocorreu e rapidamente eclodiram
revoltas. A do brigue palhaço foi a mais conhecida e trágica”, aponta a
historiadora.
Revoltas após a adesão - O processo de
adesão no Pará foi complexo e delicado já que bastava assinar um documento e
jurar fidelidade ao novo monarca Pedro I para ser considerado brasileiro e
manter seus títulos e poderes no novo estado imperial carioca. Essa situação
revoltou parte da população paraense, especialmente os funcionários públicos e
militares.
“Três meses após a adesão uma revolta
das tropas paraenses em Belém foi duramente reprimida”. Exatos 256 paraenses
que lutavam por direitos iguais aos dos portugueses que aqui viviam foram
confinados no porão do navio São José Diligente e morreram asfixiados,
sufocados ou até mesmo fuzilados. Este episódio marcou um momento de
consciência política e de identidade local. Nasceu ali um forte sentimento de
identidade paraense que irá explodir mais tarde em outros movimentos como na
revolucionária Cabanagem que eclodiu em Belém em janeiro de 1835.
“A dúvida maior era a de se descobrir
como se tornar ‘brasileiro’”, explica Magda Ricci. Para alguns paraenses ser
brasileiro era aderir ao movimento liderado por Pedro I a partir da Corte
carioca, para outros era ter nascido no Estado Imperial. “Assim, depois da adesão
de 1823, houve ainda um tempo de incertezas e dúvidas. Se a elite local estava
dividida, a população mais pobre e os escravos de origem africana perceberam
rapidamente que a independência não mudou suas vidas e diante da fragilidade da
elite poderiam também fazer uma revolução mais ampla. Tudo isso culminou em
muitos levantes e mortes, que chegaram a seu ponto culminante com a eclosão
cabana de 1835-1840”.
Construção de uma identidade brasileira -
De acordo com a pesquisadora, esse processo de construir uma identidade
brasileira no norte do Brasil ainda não se encerrou e permanece “até os nossos
dias quando, mais do que nunca, ainda se faz necessário lutar para se demarcar
uma identidade nacional mais ampla. Aquela formadora de uma cidadania plena não
só de direitos legais e constitucionais (que ainda assim são insuficientes),
mas, sobretudo, um cidadania agregadora de práticas sociais e políticas mais
igualitárias e justas”, considera.
Texto: Assessoria de Comunicação da UFPA