Os paraenses Mayra Lourrana de Souza
Silva, de Vitória do Xingu, e Victor Augusto de Alencar Menezes, de Belém,
venceram a Olimpíada de Língua Portuguesa, nas categorias poema e memórias
literárias, respectivamente.
Mayra Lourrana, aluna da Escola
Municipal Daniel Berg, foi orientada pelo professor Edio Wilson Soares da
Silva. Já Victor Augusto estuda no Colégio Militar de Belém e recebeu as
orientações do professor Paulo Reinaldo Almeida Barbosa.
A Olimpíada de Língua Portuguesa,
promovida pelo Itaú Social e Ministério da Educação (MEC), reconheceu 20
produções de todas as regiões do país, quatro em cada categoria: poema (5º ano
do Ensino Fundamental), memórias literárias (6º e 7º anos), crônica (8º e 9º
anos), documentário (1º ano do Ensino Médio) e artigo de opinião (3º ano do
Ensino Médio).
Com coordenação técnica do Centro de
Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), tem como
objetivo apoiar os professores da rede pública no aprimoramento das práticas de
ensino de leitura e escrita. A partir da metodologia do Programa Escrevendo o
Futuro, os professores realizam as oficinas de produção de texto com seus
alunos.
O concurso se iniciou em fevereiro, com
a abertura das inscrições para professores e alunos da rede pública. Recebeu
171.037 inscrições de todos os estados e teve adesão de 87,5% dos municípios
brasileiros – total de 4.876 cidades. A principal novidade foi a inclusão do
gênero documentário para alunos do 1º e 2º anos do Ensino Médio. Confira os
números do Pará abaixo.
Em 2019, a Olimpíada passou a homenagear
também autores brasileiros. Nesta edição, a homenageada foi a escritora mineira
Conceição Evaristo. Houve novidades também entre as premiações, que passaram a
incluir imersão pedagógica internacional para os professores e viagem cultural
em território brasileiro para os estudantes. As escolas dos alunos vencedores
receberão como prêmio acervo para reforço da biblioteca.
Os professores também concorreram na
categoria Relato de Prática, na qual registram suas experiências com a
realização das oficinas, descrevendo aprendizagens, descobertas, desafios e
reflexões. A premiação dessa categoria ocorreu durante a etapa de semifinais.
O concurso conta com a parceria da União
Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), do Conselho Nacional
de Secretários de Educação (Consed), da Fundação Roberto Marinho e do Canal
Futura.
Números desta edição - Pará:
144 municípios participantes;
2.144 escolas inscritas;
3.848 professores inscritos;
8.687 inscrições nas categorias;
Poema
A tela
Mayra Lourrana de Souza Silva, orientada
pelo professor Edio Wilson Soares da Silva
Pintei meu chão
Na folha do caderno,
Pintei a alegria do verão
E a tristeza do inverno.
Pintei um pedaço de pão
Que não tenho em minha mão.
Pintei minha casa,
O pinto que pia solitário.
Pintei o gato grandão
Que pinta no telhado.
E pintei um pedaço de pão
Que não pinta nem salgado.
Pintaria minha Vitória
Com tom de alegria,
Não fosse a necessidade
Que pinta no dia a dia,
Desde o nascer do sol
Até o pintar da noite.
Sonho em pintar Vitória
Com roças e pastos fartos.
E pintar o rio de histórias,
Belezas, cultura e farturas,
Porque não quero pintar
Uma roça de amarguras.
Ah! Como quero pintar
Uma vida de céu azul
Nas roças da cidade
De Vitória do Xingu.
Ah! Como quero
Pintar essa tela.
Essa quero pintar e ler
No meu velho caderno,
Pra ficar de tom eterno,
Pra que a paz possa pintar
Na terra e no teto o prazer
De ver a tela do meu lugar.
Memórias literárias
Rio afora, rio adentro… A vida segue
Victor Augusto de Alencar Menezes,
orientado pelo professor Paulo Reinaldo Almeida Barbosa
A vida é como um rio, um fluxo constante
que, às vezes, não consegue parar.
Em alguns momentos da vida, o rio é
largo e profundo; em outros, é estreito e raso. O importante é saber navegar:
aproveitar os momentos felizes e lidar com os tristes.
Como disse, o rio não para. E seguindo o
fluxo do rio da minha vida, agora estou de mudança (minha neta me ajuda com as
caixas). Ao pegar uma velha sacola empoeirada, deparo-me com uma foto da minha
infância, e isso me faz rememorar um passado feliz, em que a vida se resumia a
tão somente brincar.
Na década de 1950, o interior da
Amazônia era diferente: palafitas bem simples (casas de madeira construídas
sobre estacas) e brincadeiras nos igarapés (riachos que nascem na mata e
desaguam no rio), o que é difícil de ser encontrado hoje, até nas áreas
ribeirinhas. Minha casa era pequena, coberta com uma lona e mais parecia um
barracão. Não havia divisão entre os cômodos: meu quarto era na cozinha e ao
mesmo tempo na sala. Ali perto, havia um rio de onde tirávamos o alimento e,
também, que servia para nossa diversão. Ao redor, açaizeiros, sumaúmas e
maçarandubas, árvores típicas da Amazônia.
Às vezes, eu saía com meu pai para
caçar, pois tinha medo de ele ir e não voltar, o que acontecia com muitos
caçadores. Enquanto isso, minha mãe plantava hortaliças para nosso consumo, o
que não era garantia de comida na mesa, principalmente quando meu pai nada
trazia da floresta. Mesmo com o problema da fome, e da preocupação com meus
pais, o rio da minha vida seguia calmo, até surgir uma forte correnteza que,
aos 11 anos, me levou para longe.
Foi a primeira vez que conheci uma
capital: ruas movimentadas, automóveis, casas grandes. Onde fui morar, havia
até uma escada, e os cômodos eram muito bem divididos. Também foi quando o rio
se estreitou até quase secar, pois não aconteceu o que eu esperava: a dona da
casa – que disse à minha mãe que me acolheria para eu estudar – obrigou-me a
cuidar de uma criança e realizar todas as tarefas domésticas. O sofrimento fez
as águas do rio ficarem represadas. Fiquei muito tempo naquela situação,
impedida de conviver com o mundo.
Mas havia a esperança… E era o que me
restava. Um dia, indo comprar pão, por sorte, encontrei uma colega de infância,
a menina que retirou as pedras do meu rio, fazendo a água fluir novamente. Ela
me falou da família de um policial que queria contratar alguém para ajudar na
casa deles. Decidi aceitar o novo emprego e passei a ter uma vida mais
aprazível.
Pude, então, ir ao cinema pela primeira
vez… Ainda lembro os detalhes, a expectativa, a melhor roupa… Naquela época, ir
ao cinema era um verdadeiro evento social: sessões sempre lotadas, filmes em
preto e branco e, depois, a pipoca na praça.
Contudo, há períodos de sol e chuva tão
peculiares da Região Amazônica… Percebi que não podia nadar contra a maré,
ainda que não houvesse decidido em qual porto ficaria, então resolvi acompanhar
essa família quando se mudou para Belém, a cidade das mangueiras. Fomos morar
em uma vila de casas, ambiente muito comum naquele tempo, normalmente formada
por núcleos familiares. Para mim, foi um local novo, com pessoas, inicialmente,
estranhas, mas que depois passaram a representar decepções e alegrias que eu nunca
mais esqueceria.
Essa fase foi como o encontro do rio com
o mar: fortes ventanias e águas agitadas. Ao mesmo tempo em que um rapaz disse
que me amava, fez isso de tal modo que a família que me acolhera foi a mesma
que me expulsou por pensar mal de mim, pois, uma vez, saímos e voltamos muito
tarde. Isso era muito inapropriado para uma jovem e, naquela época, a sociedade
belenense era muito conservadora e tradicional. Da mulher, era exigido “um bom
comportamento”. Tivemos que nos casar e desse relacionamento vieram meus
filhos, motivo de alegria e determinação para fazer o melhor por eles.
Rio que flui… Enche… Seca… O meu marido
ficou em um determinado porto… Meus filhos seguiram outros afluentes… Tantos
anos depois, veio o desejo de voltar para onde o rio era largo e tranquilo, o
lugar da minha infância. Será que…
— Vovó, temos que ir!
— Sim, é claro. É o momento de tu
saberes sobre o rio…