A feirante Maria José Nascimento, 62
anos, fazia tratamento contra um câncer ginecológico quando surgiu uma
rouquidão persistente. Após dias, percebeu um nódulo crescendo no pescoço e
iniciou mais uma luta, desta vez contra um tumor de tireoide. Maria integra os
43 mil casos novos de câncer de cabeça e pescoço estimados a cada ano no Brasil
pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca).
Em referência ao Dia Mundial de Combate
ao Câncer de Cabeça e Pescoço - 27 de Julho - a campanha #JulhoVerde promove
informação para o enfrentamento deste tipo de câncer - formado por um conjunto
de tumores que acometem as regiões da boca, faringe, laringe, cavidade nasal e
seios paranasais, glândulas salivares e tireoide.
O Hospital Ophir Loyola, em Belém, que é
o Centro de Alta Complexidade em Oncologia do Pará, recebeu até o mês de junho
155 casos novos de câncer de cabeça e pescoço. Até o dia 16 de julho (há uma
semana), 302 pacientes estavam em tratamento e 230 cirurgias foram realizadas.
A especialista Deise Nunes destaca que o diagnóstico precoce é fundamental para
a cura da doença, que resulta em cerca de 10 mil mortes no país a cada ano.
"Os tumores de cabeça e pescoço têm
uma incidência muito alta. Contudo, a maioria dos pacientes desconhece esse
tipo de câncer. Por isso, a campanha busca atingir o maior número de pessoas
possíveis e alertar sobre os fatores de risco. Ainda recebemos pacientes no estágio
avançado, situação essa que reduz as chances de sucesso do tratamento",
enfatiza a cirurgiã de cabeça e pescoço.
Sem sintomas - Um dos principais
problemas é o diagnóstico tardio, que ocorre em 60% dos casos, e deixa
sequelas, alerta a Sociedade Brasileira de Cirurgia de Cabeça e Pescoço.
"A doença pode ser assintomática em fase inicial ou até mesmo ser
confundida com outras enfermidades, como uma gripe. Outro agravante consiste na
demora dos pacientes em procurar o atendimento. Costumam buscar ajuda quando os
sintomas já estão aparentes", ressalta Deise Nunes.
Antônia Lima, moradora do município de
Moju (nordeste paraense), há sete anos foi diagnosticada com um câncer de
tireoide. Ela sentiu um ressecamento na garganta, depois uma tosse constante e
dificuldade para engolir (disfagia). Passou por consultas e exames, mas os
médicos não conseguiam fechar um diagnóstico.
"Chegaram a me receitar remédio
para alergia, mas não fazia efeito. Estava muito aflita, tinha a sensação de
estar com um grãozinho de arroz preso na garganta, estava crescendo. Eu vim
para a capital fazer mais exames, o caroço estava do tamanho de uma bola de
gude. Então me encaminharam ao Ophir Loyola. O tratamento deu certo, o câncer
sumiu, hoje faço só o acompanhamento", relata Antônia, que hoje retornou
para mais uma consulta de controle, acompanhada pela filha Rosana.
A especialista Deise Nunes chama atenção
para o câncer de pele, tipo mais incidente de câncer de cabeça e pescoço na
região norte. Ela alerta para alterações como feridas na cavidade oral, boca,
gengiva e lábios que se manifestam por uma placa esbranquiçada ou avermelhada e
não cicatrizam, bem como rouquidão e inflamação por mais de duas semanas.
Fatores de risco - No Hospital Ophir
Loyola cerca de 50% dos pacientes assistidos possuem neoplasia maligna de pele
- casos avançados na pele do couro cabeludo, face e pescoço. São residentes do
litoral e da zona rural, geralmente dedicam-se à pesca e ao trabalho agrícola,
atividades em que ficam expostos ao sol por um período prolongado, sem os
cuidados adequados.
O perfil clássico é composto pelo sexo
masculino, tabagistas, alcoólatras, acima de 60 anos, com uma dieta de baixa
qualidade e baixa higiene oral. Os tumores de boca, laringe e faringe são muito
comuns nessa população.
De 30 a 40% dos casos de tumores de
garganta e cavidade oral estão associados à infecção pelo Papilomavírus Humano
(HPV), devido à prática de sexo sem preservativo. Nas mulheres, o câncer da
tireoide é o mais comum, apresentando uma incidência de quatro mulheres para
cada homem. "Na maioria dos casos, os nódulos de tireoide não apresentam
sintomas. Caso ocorra alteração, um médico deverá ser consultado", orienta
Deise Nunes.