Há mais de 40 anos, o pesquisador João
Batista da Silva, 77 anos, dedica-se ao estudo da botânica com foco em
epífitas. De lá para cá, já contribuiu, junto a outros pesquisadores, na
identificação e catalogação de mil espécies na Amazônia. Desde 2008, coordena o
programa de resgate e reintrodução de epífitas na Floresta Nacional (Flona)
Saracá-Taquera, no oeste paraense, uma iniciativa da Mineração Rio do Norte
(MRN) que tem sido essencial para a conservação das epífitas e hemiepífitas
nesta unidade de conservação.
As epífitas são plantas que vivem nas
árvores e têm elas como suporte para sobreviver, podendo crescer do tronco até
a copa. Entre os exemplos mais conhecidos estão espécies como orquídeas e
bromélias. Quando germina na árvore, vive a fase como epífita. Quando começa a
enramar, florescer, frutificar e soltar as sementes e raízes, então se
transforma em hemiepífita. “São plantas muito importantes porque têm seu
próprio mecanismo de sobrevivência. São esponjosas e, por isso, captam umidade
e nutrientes das árvores onde estão para sobreviver. São boas indicadoras de
tempo e umidade. Também são uma casa para muitos animais pequenos como insetos
que moram em epífitas, que viabilizam sobrevivência para eles. Desta forma,
sinalizam um bom desenvolvimento do reflorestamento. E têm ainda importância
ornamental no mundo todo”, explica João Batista.
Em Porto Trombetas, Oriximiná (PA), a
MRN mantém o Epifitário com amostragem de mais de 2 mil plantas de todas as
espécies da Flona resgatadas e já reintroduzidas. Paralelamente, anualmente,
mais de 20 mil epífitas são resgatadas e reintroduzidas à natureza por meio do
Programa de Resgate de Flora, que também já tem catalogadas mais de 130
espécies de orquídeas, 25 espécies de bromélias e 75 de aráceas - família
botânica composta por cerca de 100 gêneros e aproximadamente 3 mil espécies,
entre elas se destacam antúrios e copos-de-leite.
Um engenheiro florestal, um biólogo e
cinco auxiliares de campo compõem a equipe de João Batista, que desenvolve o
trabalho de preservação de epífitas e hemiepífitas coletadas, realizado antes e
após a supressão da vegetação para a lavra mineral. Por meio Programa de
Resgate de Flora são desenvolvidas as seguintes atividades: reprodução de
espécies resgatadas, montagem de coleção de referência e reintrodução das
espécies resgatadas e propagadas no Epifitário nas áreas em recuperação.
O pesquisador assinala que a experiência
tem sido gratificante pela possibilidade de compartilhar seu amplo conhecimento
e de vivenciar uma dinâmica de campo diferenciada de sua trajetória anterior,
em que o foco era fazer inventários amplos e gerais sobre a flora em vários
estados brasileiros. Nos trabalhos na Flona Saracá-Taquera, além de
levantamentos e planos de manejo, ele e sua equipe têm como foco acompanhar
todas as etapas desenvolvimento de uma mesma espécie por até 11 anos. “A mineração me deu uma experiência que eu
ainda não tinha conseguido em nenhum outro lugar: passar um ano, 10 e até 11
anos observando a mesma planta: descobrindo as suas fases, floração,
crescimento, dispersão, frutificação. Eu ainda não tinha feito, não conhecia e
gostei demais. Passar até 11 anos observando a mesma planta, parece que você
enjoa ou desinteressa, mas não é isso. Você fica cada vez mais curioso porque
nota quando a planta, por um ou outro motivo, está diferente, como, por
exemplo, o ano que não floresce, se não cresceu suficiente, e você procura os
motivos”, relata o pesquisador.

As atividades de resgate de João Batista
e sua equipe ocorrem antes e após a etapa de supressão vegetal. Antes, a equipe
entra na área para resgatar todas as epífitas que estão numa altura correta
para a coleta. “Após a supressão, vamos árvore por árvore, coletando as
epífitas que encontramos do tronco até a copa. Somos conhecidos na MRN como a
equipe das epífitas”, declara. Outra frente é contribuir com as ações de
reflorestamento. “A maior importância em nosso trabalho também é repor à
natureza parte do que foi retirada. Tratamos destas plantas no Epifitário: lá
elas são identificadas, contadas, limpas e levadas de volta para serem repostas
através do reflorestamento”, assinala João Batista.
Vladimir Moreira, diretor de Sustentabilidade
da MRN, assinala que o trabalho desenvolvido tem sido fundamental para a
conservação destas espécies na Flona Saracá-Taquera. “É gratificante acompanhar
a dedicação destes pesquisadores neste que é um dos trabalhos fundamentais em
nosso processo de reflorestamento, essencial para manter a flora preservada”,
destaca Moreira.
Compartilhamento – Para João Batista,
entre as grandes satisfações de seus trabalhos em campo estão, além das
atividades, o ambiente, o acolhimento e a interação com a equipe. “Na minha
área de trabalho na mineração, eu me sinto em casa. Estou há 11 anos aqui e,
diariamente, estou em contato com os meus colegas de trabalho. É como estar no
meio familiar. Onde todo dia posso compartilhar meu conhecimento e as vivências
do dia a dia e eles também compartilham comigo. Amo a todos eles como se fossem
meus irmãos e amigos. Isso é muito agradável”, destaca.
Experiências - Nos anos 80 e 90, João
Batista fez diversas viagens longas de trabalho de campo pelo Brasil e em áreas
de fronteira, fazendo levantamento de orquídeas na Serra dos Carajás (PA), em
Coary (AM) e no Pico da Neblina (AM). De 91 a 2007, acompanhou a primeira
comissão demarcadora de limites, que deu apoio logístico para ele acompanhar e
fazer coletas botânicas por toda a fronteira entre a República da Guiana até
Rondônia. Nestes anos, participou de campanhas na fronteira com a Guiana,
Venezuela, Colômbia e próximo ao Rio Negro. Entre outros trabalhos, também fez
um zoneamento na área de flora do estado de Rondônia e participou de
levantamentos na represa de Belo Monte. “Esses trabalhos eram de inventários e
de levantamento de reconhecimento de espécies que haviam na natureza nestas
flonas para planos de manejo”, conta.
Além da MRN e de outras grandes empresas
brasileiras, João Batista é colaborador da área de botânica do Museu Emílio
Goeldi, onde, nos anos 70, exercia atividades de pesquisa documental, mas
sempre dava um jeito de andar pelas matas com o propósito de conhecer a
floresta com foco em encontrar mais orquídeas. Em autoria e coautoria com a
pesquisadora doutora em botânica do Museu Emílio Goeldi, Manoela Ferreira,
lançou dois livros, que são resultados dos trabalhos de identificação e
catalogação de espécies de epífitas na Amazônia. “Depois de todas as
expedições, que somavam na época 30 anos de campo, descobrimos que tinha
material para escrever dois livros e tinha essa necessidade porque não havia
literatura específica sobre orquídeas na Amazônia. Das 719 espécies publicadas,
atualmente já aumentamos para mil espécies, mostrando os recentes resultados
dos nossos trabalhos. Já temos 10 espécies publicadas na Flona Saracá-Taquera e
no entorno de Oriximiná, Terra Santa e Faro. Temos mais espécies em estudo para
publicar. Se tudo der certo, teremos mais 10 para serem publicadas. Esses
estudos são importantes e necessários porque eles aumentam a listagem da flora
do Brasil”, ressalta.
Diversidade – A paixão pela natureza,
segundo João Batista, está no poder de organização, fascinação e na curiosidade
que desperta, mantendo vidas distintas em seu ambiente. “Se pararmos para
pensar que no globo terrestre temos os polos gelados, as áreas temperadas e
temos as florestas, o mar, os rios, as serras, que têm tipologia diferente e
que, para cada ambiente desse, a natureza proporciona vida para todos os
animais e todas as plantas, verificamos que a natureza é muito organizada. Cada
tipo de vida tem seu próprio lugar para morar. A beleza que é a maior atração
da natureza porque propõe prazer e alegria às pessoas. A natureza é fantástica.
É muito interessante passar dias em uma mata, em uma serra, observando a
natureza. É por isso, que eu gosto dela”, declara.
Sobre a planta que mais admira, o
pesquisador conta que é sempre a que ele encontra pela primeira vez. “E aquela
que, além de ser a primeira vez, existe a possibilidade de ser uma espécie
nova, mexe com o meu coração de verdade. Eu tenho 40 anos de campo,
possivelmente eu já descobri aproximadamente 100 espécies e eu vou continuar,
porque é assim que se trabalha e consegue resultados”, afirma.
João Batista comenta também a
importância de mais pessoas se conscientizarem sobre os benefícios de um
relacionamento harmônico com a natureza e adotarem boas práticas diariamente
neste caminho. “Eu acho que cada pessoa tem que ser um exemplo de cuidado com a
natureza, com o meio ambiente e com a conservação e a preservação das espécies
desse planeta. Seja um exemplo”, incentiva o pesquisador.