Índios devem ser consultados sobre construção da Ferrogrão, enfatiza MPF

“Queremos viver do nosso modo, e de acordo com o nosso bem viver”. Esse é o desejo da liderança indígena Alessandra Munduruku, que fala em nome das comunidades indígenas e tradicionais do entorno do traçado da Ferrovia do Grão (Ferrogrão). O projeto está cada vez mais perto de sair do papel e terá 933 km, conectando a região produtora de grãos do Centro-Oeste ao Porto de Miritituba (PA). Estima-se que 48 áreas de proteção podem ser impactadas pela obra, além de comunidades indígenas e tradicionais – que não foram consultadas sobre a implantação da Ferrogrão. Para o Ministério Público Federal (MPF), a Constituição Federal impõe a consulta prévia às comunidades indígenas e, no caso da Ferrogrão, o processo de licenciamento da ferrovia pode ser questionado judicialmente, caso a previsão legal não seja respeitada.

O imbróglio foi tema de reunião promovida nessa terça-feira (26) pela Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF (6CCR) com comunidades indígenas diretamente afetadas pela Ferrogrão. A Munduruku é uma das 19 etnias que tradicionalmente habitam a região e se tornaram invisíveis para o empreendimento, não tendo seus direitos devidamente reconhecidos nem sendo reparados pelos danos. “Nós já vimos a quantidade de problemas que a rodovia [BR-163] nos trouxe. Aumentou o desmatamento, poluiu os rios, levou nossos filhos para as drogas. As autoridades precisam ouvir o índio”, lembrou Alessandra Munduruku. As lideranças Munduruku e das comunidades tradicionais relataram também o aumento recente das invasões das terras indígenas para a exploração ilegal de seus recursos naturais, o que tem sido objeto de preocupação na região.

A ferrovia ligará as áreas de monocultivo de soja do Mato Grosso ao rio Tapajós, na altura de Itaituba, no Pará. O projeto foi apresentado pela ANTT, e questionado pelo MPF, por não ter havido consulta prévia. O procedimento de concessão da estrada de ferro chegou a ser suspenso em outubro do ano passado para que fosse realizada a consulta, mas a ANTT conseguiu uma suspensão de segurança no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que garantiu o prosseguimento do projeto.

Levantamentos setoriais indicam que a estimativa dos empresários locais é de escoar até 20 milhões de toneladas de grãos do Mato Grosso pelos portos da Bacia Amazônica.