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Arte: Pixabay / Ascom PR/AP
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A Justiça Federal em Itaituba (PA)
suspendeu os efeitos da Instrução Normativa nº 9/2020 da Fundação Nacional do
Índio (Funai), que permitia o registro de propriedades privadas sobrepostas a
terras indígenas não homologadas pelo governo brasileiro. A decisão judicial
atende pedido do Ministério Público Federal (MPF), que demonstrou que, ao
retirar terras indígenas cujo processo de demarcação ainda não foi concluído
dos sistemas de gestão fundiária (Sigef) e de cadastro ambiental rural (Sicar),
a portaria liberava na prática a grilagem de áreas e poderia intensificar
conflitos agrários.
Com a liminar, todas as terras indígenas
na região abrangida pela subseção judiciária de Itaituba – que inclui os
municípios de Aveiro, Itaituba, Jacareacanga, Novo Progresso, Trairão e o
distrito de Castelo dos Sonhos (parte de Altamira) – devem ser mantidas nos
sistemas do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra)
independente da etapa do processo de demarcação. Terras reivindicadas
formalmente por grupos indígenas, em fase de estudo e identificação,
delimitadas, declaradas e com portarias de restrição de uso agora terão que
voltar aos cadastros e ficam proibidos os cadastros sobrepostos de
particulares.
Para a Justiça Federal, ao permitir que
particulares recebessem declarações de propriedade sobre áreas já
caracterizadas como terras indígenas, a Funai utilizou-se de sua própria
“ineficiência” em concluir os processos de demarcação “para onerar os povos
tradicionais, retirando deles a segurança jurídica de alcançar o direito
originário às terras ocupadas por eles, por meio da homologação, o que lhes é
garantido pela Constituição Federal”.
“A instrução normativa da Funai não
resolve o problema original enfrentado pelos indígenas no Brasil nem o dos
possuidores de lotes rurais, lentidão no processo de demarcação de terra
indígena, pelo contrário, com a justificativa de proteger o direito de propriedade
de particulares, fere o direito originário de posse dos índios. Ainda,
transfere o ônus da ineficiência para os povos indígenas”, consta da decisão
liminar. Para a Justiça, terras indígenas devem ser protegidas mesmo antes de
concluído o processo de demarcação, tendo em vista o direito originário dos
indígenas sobre essas terras.
Outras ações - A ação judicial de
Itaituba é uma das oito iniciadas pelo MPF em junho para suspender os efeitos
da instrução normativa. Além da Funai, o Incra também é réu nas ações do MPF.
As ações judiciais pediram, em regime de urgência, que a Justiça obrigasse a
Funai e o Incra a manterem ou incluírem no Sigef e no Sicar, além das terras
indígenas homologadas, terras dominiais plenamente regularizadas, reservas indígenas
e também todas as terras em processo de demarcação nas seguintes situações:
área formalmente reivindicada por grupos indígenas; área em estudo de
identificação e delimitação; terra indígena delimitada (com os limites
aprovados pela Funai); terra indígena declarada (com os limites estabelecidos
pela portaria declaratória do Ministro da Justiça); e terra indígena com
portaria de restrição de uso para localização e proteção de índios isolados.
Pela instrução normativa da Funai, todas
essas terras indígenas seriam ocultadas no Sigef, “permitindo que particulares
obtenham declarações, realizem negócios jurídicos (sem qualquer menção à
natureza da área e a sobreposição com terras indígenas) e coloquem em risco
indígenas e o meio ambiente”, narra o MPF nas ações judiciais. Para os
procuradores da República que atuam nos municípios de Santarém, Redenção,
Altamira, Itaituba, Marabá, Tucuruí, Belém e Castanhal, se a portaria não for
suspensa com urgência, haverá aumento dos conflitos fundiários e do risco de
disseminação da covid-19 entre os indígenas.
O MPF, assim que houve a publicação da
IN 09/2020, encaminhou uma recomendação à presidência da Funai para que a
normativa fosse anulada e, ao Incra, para que não a cumprisse. A recomendação,
assinada por 49 procuradores e procuradoras da República de 23 estados da
federação, não foi cumprida pela Funai. Diante do descumprimento da
recomendação, o MPF teve que acionar a Justiça Federal.