O Ministério
Público Federal (MPF) enviou à Justiça seis ações por improbidade
administrativa contra o ex-prefeito de Belém e ex-senador Duciomar Gomes da
Costa (PTB) pelo desvio de R$ 216.783.250 entre 2005 e 2012. Também foram acusadas
outras 14 pessoas e seis empresas envolvidas nas fraudes na contratação de
empresas para a realização de obras de urbanização na capital paraense e para a
prestação de serviços de comunicação social à prefeitura.
As ações são
novas consequências das investigações que resultaram na operação Forte do
Castelo, realizada em 1º de dezembro em Belém, Ananindeua (PA), São Paulo (SP),
Brasília (DF) e Belo Horizonte (MG), com o cumprimento de quatro mandados de
prisão temporária, 14 de busca e apreensão e três de condução coercitiva.
Caso condenados,
os acusados terão que devolver os valores desviados, terão que pagar multa
igual ao triplo dos valores adquiridos ilegalmente e ficarão proibidos de fazer
contratos com o poder público por dez anos, além de ficarem com os direitos
políticos suspensos por dez anos e perderem funções públicas que eventualmente
ocupem hoje em dia.
Esquema –
Assinadas pelos procuradores da República Alan Mansur e Ubir atan Cazetta,
as ações detalham a formação de um esquema que o MPF chamou de “verdadeira
apropriação privada de contratos públicos”: pessoas ligadas ao ex-prefeito
criaram ou tornaram-se sócias de empresas e, a partir daí, essas empresas
passaram a conseguir contratos com a prefeitura por meio de processos que
restringiam a participação de outras empresas.
As ações tratam
dos contratos para gerenciamento e supervisão das obras da urbanização da Bacia
do Paracuri (R$ 1.470.074,67), para execução de obras de infraestrutura nas
sub-bacias 3 e 4 da Estrada Nova (R$ 128.502.746,15), gerenciamento e
supervisão de obras de urbanização da sub-bacia II da Estrada Nova –
urbanização de favelas (R$ 1.468.150,67), prestação de serviços de comunicação,
marketing e realização de eventos para a prefeitura (R$ 42.877.642,01),
requalificação do complexo viário do Entroncamento (R$ 34.736.664,56), e
repasses injustificados de recursos referentes às obras do BRT e do Portal da
Amazônia (R$ 7.727.972,07).
Uma das
empresárias de fachada, segundo o MPF, é a companheira de Duciomar Costa, Elaine
Baía Pereira. Em 2003 ela – que tem um filho com o ex-prefeito – declarou à
Receita não ter nenhum bem. Em 2012, último ano do segundo mandato de Duciomar,
Elaine Pereira já tinha patrimônio declarado de R$ 9 milhões, e chegou aos R$
12 milhões declarados em 2015. Além disso Elaine é a sócia das construtoras SBC
e Metrópole, que possuem um conjunto de bens avaliado em R$ 110 milhões.
O mesmo tipo de
inflação patrimonial se repetiu com outros sócios e administradores das
empresas privilegiadas pela prefeitura, todos ligados a Duciomar Costa: Ilza
Baía Pereira, irmã da companheira de Duciomar Costa, conseguiu ampliar o
patrimônio de R$ 82 mil reais em 2008 para quase R$ 2 milhões em 2015.
Um dos
ex-assessores, Célio Souza, foi contratado em 2008 pela prefeitura para
trabalhar como gari. Em 2015 já tinha um patrimônio de R$ 1,6 milhão.
Os procuradores
da República observam que grande parte das empresas citadas foram constituídas
ou retomaram as atividades empresariais em 2005, tendo passado a apresentar
valores de faturamento declarado superiores a centenas de milhares de reais,
por um curto prazo de tempo (cerca de um a três anos) – justamente durante os
mandatos de Duciomar Costa –, e depois ficaram inativas ou não apresentaram
declaração à Receita Federal.
Obstáculos –
Entre os obstáculos que o grupo criava para barrar nas licitações as empresas
concorrentes estavam, por exemplo, a exigência da apresentação de documentos ou
de garantias contábeis não previstos na legislação como obrigatórios para participação
em licitação, a não divulgação de dados básicos – como o endereço em que a obra
deveria ser realizada –, o impedimento à participação de consórcios sem que
houvesse justificativa técnica para essa decisão, a publicação de editais nas
vésperas de feriados, o estabelecimento de prazos bastante curtos para a
apresentação de informações pelas empresas participantes, a realização de
contatos prévios com empresas vencedoras – fora das páginas dos processos –, a
exigência de que as empresas contratassem funcionários apenas para poderem
concorrer aos contratos, e até a instituição de cláusulas que impediam a
contestação dos resultados dos processos licitatórios.
“Ora, os achados
na investigação indicam que a elaboração de editais com cláusulas tão restritivas
tinha o claro intuito de não somente restringir a ampla participação de
empresas interessadas, mas também de já direcionar o resultado de modo a
favorecer determinadas empresas. Curiosamente as empresas participantes e
vencedoras dos certames licitatórios realizados pela prefeitura de Belém no
período analisado tinham por sócios pessoas direta ou indiretamente ligadas ao
ex-senador e ex-prefeito Duciomar Costa, sem capacidade econômico-financeira
compatível com o porte das licitações, dessumindo-se, então, que a licitação
foi mero expediente para captar os recursos públicos”, destacam os membros do
MPF.
Repasses – Além
de fraudes na contratação de empresas de pessoas ligadas ao ex-prefeito, as
investigações também detectaram que uma dessas empresas, a construtora
Metrópole – de propriedade das irmãs Elaine Baía Pereira e Ilza Baía Pereira –,
recebeu repasses da Andrade Gutierrez, companhia também acusada de envolvimento
em desvios de recursos da prefeitura.
Apesar de não
ter funcionários, a Metrópole foi contratada pela prefeitura. A partir daí
começou a receber recursos das empresas Andrade Gutierrez Engenharia e
Construtora Andrade Gutierrez. Os repasses são diretamente relacionados aos
períodos de acerto, licitação e contrato das obras dos projetos Portal da
Amazônia e BRT, observam na ação os procuradores da República Alan Mansur e
Ubiratan Cazetta.
“Os repasses
foram feitos pela Andrade Gutierrez de forma gratuita à empresa Metrópole, que
era de propriedade de Elaine Baía (atual companheira de Duciomar), Ilza Baía
(irmã de Elaine), Adriano Andrey (genro de Duciomar) e Célio Araújo
(diretamente ligado a Duciomar) para obter vantagens em licitações, acertos e
contratos das obras Portal da Amazônia e BRT-Belém junto à prefeitura de
Belém”, registra uma das ações.
A partir de ação
do MPF, a Justiça Federal no Pará chegou a anular a concorrência pública realizada
para selecionar a construtora do Portal da Amazônia, em que a Andrade Gutierrez
saiu vencedora, mas o Tribunal Regional Federal, em Brasília, derrubou a
decisão.
Na ação, o MPF
havia denunciado que a licitação se baseou apenas em estudos preliminares, sem
o rigor exigido legalmente em relação ao detalhamento da obra, e que a
licitação foi realizada antes dos estudos de impacto ambiental.
No caso do BRT,
licitação também vencida pela Andrade Gutierrez, a Justiça Federal acolheu o
pedido do MPF e condenou o ex-prefeito e a ex-presidente da Comissão Permanente
de Licitação da prefeitura Suely Costa Melo a devolver R$ 42,9 milhões aos
cofres públicos, além do pagamento de multa individual de R$ 4,9 milhões.
Entre as
irregularidades estavam a falta de abertura de novo prazo para recebimento de
propostas após retificação do edital, ausência de recursos orçamentários que
garantissem o pagamento das obrigações e incompatibilidade entre o projeto da
prefeitura e o projeto do governo estadual para o trânsito da capital.
Denúncias – As
informações levantadas pelo MPF durante as investigações do caso Forte do
Castelo – investigações que tiveram o apoio da Controladoria-Geral da União
(CGU) e da Receita Federal – também resultaram este mês no oferecimento de denúncia
criminal contra o ex-prefeito e seis outros envolvidos com as fraudes.
Eles são
acusados de formação de quadrilha, fraude a licitação e de crime de
responsabilidade, que podem resultar em condenação à prisão, devolução do
dinheiro desviado aos cofres públicos e indenização por danos morais à
coletividade.
O MPF pede que
eles sejam obrigados a ressarcir os cofres públicos em cerca de R$ 130 milhões,
valor das três licitações que fraudaram e, ainda, a pagar indenizações por
danos morais à coletividade no valor de R$ 4 milhões para Duciomar Costa,
Elaine e Ilza Baía Pereira, de R$ 1 milhão, para Jean Nunes, Célio Souza e
Fernando Salerno e de R$ 50 mil para Paulo Fernando Vieira.
Outros processos
– Além de ter sido impedido de concorrer nas eleições de 2014 e 2016 por ter
sido condenado por abuso de poder político nas eleições de 2008, Duciomar Costa
está inelegível pelos próximos oito anos com base na lei da Ficha Limpa, por
ter sido condenado pela Justiça Federal em outro processo aberto a partir de ação
do MPF.
Além das ações
decorrentes das investigações do caso Forte do Castelo, o ex-prefeito responde
a 15 processos na Justiça Federal e 13 processos na Justiça Estadual, a maioria
por improbidade administrativa.
Acusados nas
ações por improbidade do caso Forte do Castelo:
Adriano Andrey
Carreira Nunes
Alcidemar
Guimarães Leal
Ana Emília Brito
Leitão Siqueira
Andrade
Gutierrez Engenharia S/A
B. A. Meio
Ambiente Ltda. (acusada em duas ações)
Célio Araújo de
Souza (acusado em três ações)
Délcio Donato
Pantoja Oliveira
Duciomar Gomes
da Costa (acusado nas seis ações)
Edson
Evangelista Marinho Filho
Elaine Baía
Pereira (acusada em quatro ações)
Fernando Benatti
Salerno
I9 Mais Serviços
de Comunicação Ltda. - ME
Ilza Baía
Pereira (acusada em cinco ações)
Jean de Jesus
Nunes (acusado em duas ações)
Márcio Barros
Rocha
Maria de Nazaré
Brito Siqueira
Metrópole
Construção e Serviços de Limpeza Ltda.
Paulo Fernando
Colares de Oliveira Vieira
SBC - Sistema
Brasileiro de Construção Ltda. (acusada em quatro ações)
Uni Engenharia e
Comércio
Yuseff Leo
Leitão Siqueira
Números dos
processos:
1003247-48.2017.4.01.3900,
1003252-70.2017.4.01.3900, 1003254-40.2017.4.01.3900,
1003292-52.2017.4.01.3900, 1003299-44.2017.4.01.3900, e
1003314-13.2017.4.01.3900
Íntegras das
ações:
As íntegras das
ações estão sendo editadas para retirada de dados sigilosos e ainda nesta
quarta-feira (27/12) serão publicadas no site do MPF no Pará, em https://goo.gl/LLzsh7 .